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O que diz o médico? Fernando Leal da Costa

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Estar doente é recordar o nosso estatuto de seres mortais.

A sensação de desamparo, medo, imprevisibilidade e necessidade de ajuda é real e verdadeira.

Quanto mais séria for a condição de saída, mais aguda é essa necessidade.

Necessidade de reparação. Física e psicológica.


TÓPICOS E TEMPOS

Escutar os Doentes (00:03:15) Como escutam os médicos os seus doentes, Fernando Leal da Costa fala sobre a importância da comunicação não verbal.

Linguagem na Comunicação Médica (00:06:34) Fernando Leal da Costa discute a importância de traduzir as informações médicas para uma linguagem compreensível e de separar o que é importante do acessório, nos relatórios médicos.

Impacto da Internet e Inteligência Artificial (00:08:09) A discussão aborda o impacto da ‘internet’ e da inteligência artificial na medicina, salientando a necessidade de orientar os doentes e o potencial tranquilizador ou inquietante destas ferramentas.

Medicina Baseada na Evidência e Inteligência Artificial (00:10:47) A medicina baseada na evidência e o debate sobre a capacidade atual das máquinas em substituir o diagnóstico humano.

Responsabilidade na Era da Inteligência Artificial (00:13:22) A discussão centra-se na responsabilidade e na confiança na era da inteligência artificial, abordando o papel do médico como mediador e a importância da confiança do doente.

Lidar com a Incerteza na Prática Médica (00:16:17) A complexidade de lidar com a incerteza na prática médica, especialmente em situações de tratamento paliativo, e a importância de ser honesto com o doente.

A Importância da Escuta Ativa (00:18:16) O médico discute a importância de mudar a conversa para assegurar que o doente seja ouvido.

Adaptação à Doença (00:19:26) O médico aborda diferentes mecanismos de adaptação dos doentes à doença, incluindo a negação e a procura por informações.

A Relação entre Pensamento Positivo e Prognóstico (00:21:19) É discutida a relação entre o pensamento positivo dos doentes e o prognóstico, especialmente em casos de cancro.

Impacto da Pandemia nos Profissionais de Saúde (00:25:56) O médico fala sobre o impacto da pandemia nos profissionais de saúde, incluindo a perda de doentes e o medo das infeções respiratórias.

Reorganização do Sistema de Saúde (00:29:22) O médico propõe uma reorganização do sistema de saúde para ampliar a resposta e assegurar acesso a qualquer médico disponível, público ou privado.

Custo do Tratamento do Cancro (00:31:53) É abordado o aumento do custo do tratamento do cancro em comparação com a eficácia do tratamento.

O Custo do Sucesso (00:32:12) Discussão sobre o aumento da procura por serviços de saúde, o fenómeno das urgências e a busca por atendimento médico.

Falta de Médicos Experientes (00:36:20) Falta de médicos mais velhos para ensinar a nova geração, consequências das decisões políticas e distribuição etária dos médicos.

Emigração de Médicos (00:38:27) Motivos da emigração de médicos portugueses para outros países da União Europeia e as condições de trabalho.

Desafios da Nova Geração (00:41:30) A menor tolerância da nova geração para más condições de trabalho e a procura por um equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Adaptação às Mudanças (00:43:53) A evolução da medicina com a introdução da tecnologia e a necessidade de tornar o sistema mais amigável para os médicos.

A Importância da Comunicação Médico-Paciente (00:44:41) Discussão sobre a vontade de conversar dos médicos mais novos e a necessidade de apoio e estímulo.

Mudanças no Sistema de Saúde (00:45:38) Reflexão sobre a dinâmica da evolução da medicina e a distribuição desigual de médicos e enfermeiros em Portugal.

Participação dos Cidadãos nas Decisões de Saúde (00:46:59) Debate sobre a voz dos cidadãos na política de saúde e a necessidade de maior inclusão e responsabilidade dos eleitos.

O Futuro da Medicina (00:50:26) Reflexão sobre a satisfação profissional enquanto médico e a expectativa de avanços tecnológicos na medicina.


Nesta edição ouço um médico com quem aprendi muitas coisas. Falei com ele ao longo da vida, e nos seus vários papeis, dezenas de vezes.

Médico, pensador da saúde pública, alto funcionário do SNS e até, secretário de estado e finalmente ministro da saúde.

Falo de Fernando Leal da Costa.

É médico especialista em hematologia e oncologia.

De forma mais direta e muito simplifica da: trata doentes com cancro no sangue.

O que significa ouvir muitos doentes, explicar coisas difíceis, saber que nunca se sabe de tudo a todo o tempo e cultivar uma relação de confiança com outros seres humanos em grande sofrimento.

É sobre esse momento quase sagrado da fala e da escuta que nos debruçamos nesta edição.

O momento da pergunta e das respostas.

Da esperança e dos limites da possibilidade humana de resgatar o outro.

Entre a compaixão e o caminho que ainda falta percorrer.

Com o diálogo necessário, delicado e negociado entre o médico e o doente.

O que quer saber tudo. O que evita saber e delega tudo.

A comunicação não inclui só palavras. Há os gestos e os não ditos.

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JC (00:00:00) – Viva. Professor Fernando Leal da Costa, médico hematologista e oncologista, tem as duas especialidades. Teve um pé também pela política e alguém que intervém na sociedade a refletir sobre estas coisas de saúde. Interessa muito. Para começar, é sempre uma curiosidade que eu tenho, que é como é que se escutam os doentes.

FLC (00:00:25) – Com muita atenção. Há um conjunto de mensagens que são relativamente directas e que resultam das perguntas que nós, mais ou menos, eu diria consuetudinária mente fazemos. E depois há toda uma comunicação associada, que era a forma como as coisas são ditas, que era aquilo que não é dito, a própria mímica que nos transmite um conjunto de informações muito importantes para conhecermos aquela pessoa e de alguma forma conseguirmos adaptar progressivamente a nossa mensagem a aquilo que são, por um lado, as necessidades e, por outro lado, os desejos de quem nos escuta.

JC (00:01:08) – Isso vê se logo desde o momento em que essa pessoa entra no consultório.

FLC (00:01:13) – Sim, quando já temos algum treino. A forma como a pessoa se aproxima de nós se dirige até à cadeira onde se vai sentar.

FLC (00:01:24) – O tempo que por vezes espera até decidir sentar se ou eventualmente até alguns doentes, enfim, mais tradicionais, esperarem que lhes seja indicado que se devem sentar. Tudo isso são indicações preciosas e depois a própria forma como aqueles metros são percorridos, uma vez que nós infelizmente não temos acesso a ver o doente percorrer o corredor e essa seria uma informação importante. Aqueles pequenos métodos já nos dizem muito sobre, por exemplo, a condição física da pessoa, a condição emocional e já nos prepara de alguma forma para aquilo que nós podemos. Quer em termos daquilo que são as ferramentas terapêuticas, quer em termos daquilo que são as ferramentas comunicacionais. Utilizar quer.

JC (00:02:06) – Dizer que o corpo que o nosso corpo fala.

FLC (00:02:09) – Muitíssimo. Muitíssimo. E essa é uma das partes mais importantes da medicina e sermos capazes de ler. Toda a comunicação que está associada à pessoa e que não depende estritamente da fala. As pessoas literalmente falam com o corpo e o corpo sendo observado. Transmite nos imensa informação de extrema utilidade para as decisões que temos que tomar em proveito dessa própria pessoa.

JC (00:02:36) – Quando, Quando nós estamos numa situação de fragilidade, como é o caso dos doentes e em particular doentes de cancro, onde as notícias não são boas e o início da conversa, digamos, nós, pelo menos aqueles doentes que que mais, que mais cuida? Preocupa se com no fundo com o medico. Ex. Há sempre aquela quando nós abrimos um exame médico não entendemos o que é que lá está. O doente no fundo está fragilizado, está com medo, muitas vezes naturalmente, não sabe o que é, o que lhe está a acontecer, não sabe como é que é o futuro. E depois há ali um médico que que o pode ajudar, seguramente. E então ele é a linguagem.

FLC (00:03:19) – É fundamental descodificar e traduzir para termos que sejam perceptíveis por toda a gente a informação que nós consideramos que é importante para essa pessoa. Normalmente, os relatórios dos exames têm muita informação que eventualmente até pode ser importante para o médico. Pode ser importante até como controlo de qualidade relativamente a quem lê aquilo, mas que não tem nenhum impacto clínico significativo.

FLC (00:03:49) – É um dos trabalhos que nós temos é explicar aos doentes, separar. No fundo, não diria o trigo do joio, mas aquilo que é importante do que não é importante e, ao mesmo tempo, utilizar linguagem que qualquer pessoa seja capaz de entender.

JC (00:04:01) – A ideia de conseguirmos fazer algum dia, de termos relatórios médicos para tótós pode fazer sentido ou é perigoso e perigoso.

FLC (00:04:09) – É preferível utilizar a linguagem convencional na comunicação entre médicos e depois entregar ao profissional o trabalho de descodificar essa linguagem. E é curioso que os médicos, se o fizerem bem feito, ao fim de algum tempo, assistimos aos doentes a discutirem connosco, quase que em pé de igualdade, as análises clínicas e os exames, porque nós ensinamos lhes eles saberem interpretar aquilo. Isto é extremamente importante para que o doente, ele próprio, seja capaz de fazer uma avaliação do seu, do seu estado, da sua resposta, da forma como funciona. E já.

JC (00:04:48) – Agora, tem uma curiosidade que é o Dr. Google ainda ainda vai aparecendo na Ainda vai aparecendo nas consultas.

FLC (00:04:54) – Muito. E também aí é muito importante nós sermos capazes de descodificar a linguagem dos problemas da net. Eu sou um apaixonado do uso da internet. É que se por um lado facilita aquilo que é a tomada de conhecimento por parte dos doentes, por outro lado, neste momento em que estamos e com as ferramentas, a inteligência artificial será progressivamente cada vez mais complicado. A informação disponível é brutal, enfim, é incomensurável e de difícil digestão. E, portanto, eu sou daqueles que acredita que, por mais que nós possamos eventualmente temer entre aspas o efeito enfim, informativo ou informativo daquilo que não interessa, se o médico tiver um papel de mediador e souber orientar o doente para aqueles que são os sítios onde ele deve pesquisar melhor e estiver sempre disponível para contextualizar e traduzir aquela linguagem. Essas ferramentas são também muito úteis, particularmente porque se forem bem utilizadas, podem ser tranquilizadoras. Se forem, se forem mal utilizadas, são profundamente inquietantes. Lá está.

JC (00:06:12) – Porque nós vamos lá à procura de uma determinada condição, uma determinada condição.

JC (00:06:16) – E o raio do Google geralmente escolhe para nos mostrar o pior do pior, aquilo que é o mais dramático, aquilo que nos atrai mais a atenção. E é assim que o algoritmo funciona.

FLC (00:06:26) – É muito mais fácil, do ponto de vista do tratamento da informação computorizada, escolher os extremos, a dificuldade. E é por isso que nós, humanos, temos um papel importante enquanto mediadores. É fazer a conjugação dos extremos, encontrar um meio termo. E a grande verdade é que todas as classificações, todas as qualificações, sendo necessariamente em termos estatísticos muito discretas, é aquilo e não é outra coisa. No fundo, ao abolir as zonas cinzentas, acaba por abolir o. Digamos, a parte mais significativa da humanidade em termos biológicos.

JC (00:07:04) – Portanto, cada um de nós e cada um. Cada caso é um caso. Cada doente é um doente, cada doença, uma doença tem uma expressão própria.

FLC (00:07:09) – Absolutamente. É por isso que o papel mediador do médico, por enquanto, é o de processar um enorme conjunto de informação, nomeadamente aquela de que falávamos há bocadinho, que é capturada quando nós olhamos para o doente e depois conhecer a evidência disponível e adaptá la àquele caso concreto.

FLC (00:07:32) – A medicina baseada na evidência é uma realidade e uma necessidade, mas a própria definição diz nos que é a utilização da melhor evidência disponível para ajudar o médico e o doente a tomarem as melhores decisões relativamente ao seu caso ou a cada caso concreto.

JC (00:07:46) – Notei que usou a expressão o médico por enquanto.

FLC (00:07:51) – Por que eu? Porque eu acredito e já tive muitas discussões sobre esta matéria com colegas e não só. Eu acredito que nós estamos numa fase muito larvar da inteligência artificial e daquilo que é possível fazer hoje em dia do ponto de vista da computação pura. Mas não vejo nenhuma razão teórica para que eventualmente, um dia, aquilo que para já, nós só ouvimos nos filmes de ficção científica não seja possível com a capacidade de nós, humanos, eventualmente criarmos androides ou que lhes quiser chamar, com uma capacidade de raciocínio, inclusivamente utilizando emoções que são parte importante do raciocínio para poderem realizar algumas tarefas que nós humanos realizamos mais depressa e se calhar com uma maior probabilidade de acertarem. Dito de outra forma, com uma menor probabilidade de erro.

JC (00:08:43) – Mas não é consensual entre a classe médica a forma de usar o tempo, o tempo e o modo de usar essas ferramentas de inteligência.

FLC (00:08:52) – As ferramentas, para já, ainda não existem, com o rigor que nós quereríamos para a interacção clínica. Aquelas que existem são muito boas, nomeadamente para a capacidade de fazer diagnósticos, porque já conseguem capturar muita informação e utilizar raciocínios de probabilística que um cérebro humano tem mais dificuldade em fazer, nomeadamente por conjugar multi variáveis no fundo. E desse ponto de vista, os computadores são imbatíveis. Agora, naquilo que se prende com a adaptação do diagnóstico para a escolha de um tratamento adaptado àquela pessoa, o número de variáveis que nós estamos a falar ainda é demasiado grande para que haja, neste momento, computadores, máquinas que nos substituam a esse ponto.

JC (00:09:37) – Eu tenho uma curiosidade a propósito da inteligência artificial, que é como é que nós lidaremos com um futuro em que a máquina consiga não só sistematicamente resolver melhor problemas que os humanos, consiga aprender ela própria e desenvolver técnicas que os humanos não tão rapidamente consigam fazer, mas perdermos depois a capacidade de que tudo se passe dentro de uma caixa negra que nós não sabemos bem como é que funciona.

JC (00:10:07) – E hoje temos o médico. Eu posso perguntar ao médico. Em última instância, ele é o responsável, permite me dizer, É a minha responsabilidade. Eu sei ou não sei e a máquina não dirá nada. Ficámos aqui no limbo, entre a maravilha da máquina que não podemos abandonar e a maravilha da máquina ou o assustador da máquina que não, que não conseguimos responsabilizar o parar.

FLC (00:10:29) – E esse é um dos grandes problemas da inteligência artificial neste momento. Enfim, outro dia o Alan Musk dizia que enfim, porventura qualquer dia nós teremos que encontrar uma forma de imaginar um rendimento universal garantido, porque haverá desemprego de tal forma no sentido em que as máquinas são capazes de substituir os homens Na maior parte das tarefas que hoje em dia a humanidade realiza. Mas é verdade que, sendo certo que isso é assim naquilo que se prende com a responsabilidade e aquilo que está associado aos valores de responsabilidade, provavelmente nós não teremos capacidade para dispensar, porque não fomos programados de outra forma para dispensar o ser humano. Porque nós, enquanto seres humanos, confiamos noutros seres humanos.

FLC (00:11:15) – A nossa capacidade de confiar numa máquina é porventura mais limitada, até porque nós temos, de alguma maneira, uma certa tendência para imputar aos outros humanos, nomeadamente na relação com os médicos, algum grau de infalibilidade, enquanto que, a priori, nós achamos sempre que as máquinas, mais tarde ou mais cedo, podem se avariar.

JC (00:11:34) – Como é que lida com esse fenómeno de de as vezes terem a expectativa, as pessoas de que é quase Deus?

FLC (00:11:43) – É preciso termos a humildade suficiente dentro de nós próprios para temperar essa expectativa.

JC (00:11:48) – Mas a crença é importante para Para o doente.

FLC (00:11:52) – É fundamental na relação médico doente. Porventura, o passo mais importante é o facto de o doente acreditar no médico. A partir do momento em que o doente deixa de acreditar naquela pessoa que o trata, quebrou se a relação, quebra se a relação a vários níveis. Não vai acreditar nos tratamentos, não vai acreditar naquilo que lhe está a ser dito, não vai ter confiança suficiente para seguir um conselho. E é por isso que uma das principais bases da comunicação por parte do médico é não ser mentiroso.

FLC (00:12:23) – Porque um médico que mente é um médico que pode ser apanhado nas suas mentiras e a partir daí o doente deixa de acreditar no médico. E como é que.

JC (00:12:32) – Se resolve a questão do desconhecimento? Porque imagino que haja determinados doentes que lhe aparecem até de uma forma atípica e que que não há soluções fáceis, não são seguramente previsíveis e, eventualmente, exigem um estudo especial. Como é que lida com essa por esta ambiguidade? No fundo, a relação do conhecimento. Esta pessoa procurou me e eu não lhe posso mentir, mas também não posso retirar o crédito e a fé que há nesta relação entre nós os dois.

FLC (00:13:02) – Há dois pontos importantes aí. Um ponto prende se com o facto de nós, em determinados momentos que estão claramente identificados, termos que ter a capacidade de dizer ao doente aquilo que não sabemos, mas que vamos procurar saber. Ou seja, a relação nunca deve ser na base do eu não sei, não quero saber. Não, eu não sei e vou tentar saber. E depois há um outro momento que de facto é complexo, que é quando nós passamos daquilo que são intervenções de caráter eminentemente curativo ou, se quisermos, de paralisação à distância.

FLC (00:13:36) – Enfim, muito pouco Na medicina é verdadeiramente curativo. Mas na realidade, existem circunstâncias em que nós podemos imaginar um contexto em que, de alguma forma, temos qualquer coisa para oferecer aos doentes que vai melhorar muito a sua qualidade de vida e, eventualmente, a duração da sua vida. Mas há momentos em que nós já não podemos garantir um aumento de duração da vida das pessoas, mas podemos sempre, de alguma forma, garantir uma melhoria do conforto. E desse ponto de vista, temos que responder aos doentes muito em função daquilo que ele quer ouvir. Há doentes que claramente nos dão sinais, que há coisas que preferem não saber.

JC (00:14:13) – Não saber toda a verdade em todo o momento, de uma forma crua, já.

FLC (00:14:17) – Disseram, já me disseram taxativamente isso eu não quero saber. E já ou já houve circunstâncias em que eu percebo que há um ponto da realidade que eu não vou ser capaz de explicar.

JC (00:14:30) – Aquela pessoa, portanto, vai, passinho a passinho, experimentando ver até o ponto, muito lentamente. Quando há uma pergunta directa, imagino que que responda.

JC (00:14:40) – Como é que se lida com a expressão se calhar não é feliz, mas eu vou usá la com a surdez do doente quando recebe um doente, um diagnóstico tão dramático como o do cancro e a partir deste momento, no fundo, deixa de ouvir durante um no resto da consulta. Nas próximas consultas.

FLC (00:15:01) – A22 processos diversos um é esse que tem que ver com aquilo que se prende com o choque imediato. E normalmente o que nós fazemos é quando, a partir de um determinado momento, percebemos que já não estamos a ser ouvidos, mudamos de conversa, passamos para outro ponto. Sugerimos à pessoa que ela, eventualmente, se tiver dúvidas, que escreva, para que não se esquecer delas, voltar a perguntar lhes no ponto seguinte. Quando ficamos claramente com a sensação de que houve coisas importantes que ele não percebeu, repetimo las numa noutra, nas consultas seguintes. Às vezes é preferível que os doentes venham acompanhados e se não vieram acompanhados da primeira vez, nós sugerimos ou ele não quer trazer alguém consigo para poder ajudar depois a falarem sobre isto, etc.

FLC (00:15:47) – E, portanto, isso já é uma mediação em que vamos encontrar um terceiro que possa fazer esse papel e também a ponto em que é aquilo que eu me referi anteriormente, a mecanismos que estão razoavelmente bem tipificados de adaptação à doença. E nós temos que perceber qual é o mecanismo que está em causa e a doentes que assumem como estratégia de adaptação a negação pura e simples.

JC (00:16:11) – Eu não quero saber. É e é um direito legítimo, absolutamente legítimo.

FLC (00:16:15) – É um mecanismo de adaptação que está descrito e que faz parte, enfim, das funções fisiológicas cerebrais do ser humano. E desse ponto de vista, nós não temos o direito de ser violentos ao ponto de contrariar esse mecanismo de adaptação, gerando um maior incómodo, maior perturbação para o doente.

JC (00:16:34) – Então, é no outro topo da escala que é aquele doente que quer saber tudo e eventualmente até quer participar nas decisões terapêuticas para para o futuro, mas que está a lidar com uma complexidade, porque tudo hoje é muito complexo e pede ajuda para para tentar perceber. E faz perguntas do género quantos meses de vida é que eu tenho? O que é que eu posso fazer? Eu preciso? Eu preciso de resolver a minha vida.

JC (00:16:59) – Imagino que esta expressão seja dita muitas vezes no consultório em Portugal.

FLC (00:17:04) – Nem tanto, Curiosamente. Mas para clarificar os doentes que têm aquilo que se chama um espírito de luta. Muitas vezes estes doentes estão associados a um espírito de luta, porque há duas maneiras de lidar com a realidade querer sabê la a doentes que ficam particularmente desesperados e, portanto, esses doentes têm de ser ajudados de outra forma. Porque o facto de quererem saber a realidade ajuda os a ficar ainda mais desesperados. E estes momentos têm de ser lidados com de outra maneira e temos profissionais que nos ajudam nesse campo. O tratamento do cancro não é um tratamento unipessoal, é cada vez mais um tratamento multidisciplinar e portanto, falamos muito uns com os outros, nomeadamente com equipas de psicólogos, psiquiatras, etc. Quando percebemos que essa que é a necessidade de intervenção nessa área.

JC (00:17:53) – E é uma resposta mesmo individualizada.

FLC (00:17:55) – A uma resposta individualizada, mas também, como eu estava a dizer, há doentes que querem saber tudo porque isso os predispõe para a luta. Esses doentes, curiosamente em melhor prognóstico.

FLC (00:18:04) – Enfim, se está razoavelmente bem estudado, a sério? Sim, sim, isso está razoavelmente bem estudado. São os doentes que têm uma maior predisposição para lutar contra a doença, nomeadamente um cancro. Tem um prognóstico melhor do que aqueles que se acomodam ou que negam, ou que pura e simplesmente se deixam levar pelo desespero. Ninguém sabe exactamente porque é que isso é assim. Há muita teoria. O mais fácil é dizer que um doente que tem uma grande capacidade de luta tem uma maior aderência ao tratamento. Mas não é só isso. Nós sabemos que os doentes que têm um fighting spirit, enfim, o termo técnico em inglês mais desenvolvido tem até uma probabilidade menor de recair da sua doença, o que é extremamente curiosa a relação entre o pensamento positivo que ele existe neste caso, e a sobrevivência uma doença como um cancro. E isto não é. Não é uma impressão. Isso está muitíssimo bem estudado, como também sabemos que há circunstâncias em que determinados eventos adversos na vida de uma pessoa, nomeadamente coisas tão complexas ou tão, tão tão simples como um divórcio no curso da sua, da sua doença cancerosa, aumenta a probabilidade de a doença da doença voltar e.

JC (00:19:17) – Provavelmente baixa o nosso sistema.

FLC (00:19:18) – Imunitário a uma. Era isso que eu ia dizer. Há uma relação muito clara entre o estado afectivo e o estado imunitário. Hoje em dia até conhecemos os neurotransmissores. Estão envolvidos nessa matéria. Não é por acaso que, por exemplo, algumas substâncias que são usadas para tratar, enfim, doenças psiquiátricas. Olha, um medicamento muito antigo, o lítio, que é utilizado como estabilizador do humor, tem impacto muito significativo na imunidade a vários níveis, estimulam um conjunto de células importantes, etc. E, portanto, nós somos de facto uma máquina muito complexa, mas muito unitária. É muito, muito errada a ideia de que uma coisa é a nossa vida espiritual ou afectiva, outra coisa é a nossa vida somática. Elas estão completamente interligadas e uma pode ajudar a outra. É uma relação biunívoca. É muito importante.

JC (00:20:06) – Como é que um médico, ao fim de tantos anos a cuidar de doentes, com muitos deles com prognóstico reservados, muitos que que acabam por morrer? Como é que se programa? Como é que resiste? Como é que consegue misturar a dose certa entre humanidade, pragmatismo e defender se mentalmente?

FLC (00:20:27) – Às vezes também nos deprimimos.

FLC (00:20:30) – Eu próprio tenho os meus dias de maior depressão. Tenho os meus dias em que é mais complicado sair da cama para vir trabalhar. Também me canso. Também tenho minhas horas de esgotamento. Mas também, verdade seja dita, tenho tido muitas alegrias ao longo da minha vida enquanto profissional de saúde e portanto, penso sempre e tento agarrar me sempre àqueles que são os aspetos mais positivos que me levam a querer continuadamente, a lutar por saber que ajudei alguém há muitos anos. Eu nem vou dizer aqui antes, porque enfim, seria quase traumático. Mas enfim, posso dizer a quase 40 anos já eu era médico. Estava a discutir exactamente se deveria não ouvir para a especialidade que tenho de hematologia Clínica e essencialmente trato de doentes com cancro do sangue e na altura um médico por quem tenho uma grande consideração. Estava eu a queixar Epá, mas isto há 40 anos atrás, aquelas doenças, enfim, os doentes depois morrem, aquilo muitas vezes não são curáveis. Eu disse ouve lá, mas na verdade. Quantos doentes com esta ou aquela patologia é que tu considera que curaste? E eu pus me a pensar.

FLC (00:21:33) – Na verdade, o essencial da medicina não está na cura, está na capacidade que nós temos de melhorar ao longo da vida a qualidade de vida dessas pessoas e, se possível, prolongar lhes a vida. E desse ponto de vista. Acho que fiz a escolha certa, até porque hoje em dia, claramente. Enfim, depois seria tema de outra conversa. As ferramentas de que dispomos do ponto de vista terapêutico não têm nada a ver com aquilo que fazíamos há 40 anos atrás e, portanto, eu imagino que quem vier a seguir daqui a 40 anos pensem aqueles bárbaros que em 2002 1024 faziam isto e aquilo e não evoluímos. Nem imaginas em 2024 que eles faziam. Mas isso é natural e a evolução? Ainda bem que é assim.

JC (00:22:15) – Há uma coisa que nós acabamos de sair da pandemia de Calvi 19. Tenho a sensação empírica. Não tenho nenhuma estatística sobre isso, de que, enquanto sociedade, estamos todos francamente mais cansados. Até se calhar irritáveis. É, mas a factura principal foi foi nos profissionais de saúde que tiveram que tiveram isso de que conversam, os de que conversa com outros seus colegas médicos que não estão nós aqui?

FLC (00:22:41) – Especificamente no sítio onde trabalho e com a proximidade que tenho, fomos relativamente poupados a uma das partes importantes da corrida, ou seja, fomos poupados as horas excessivas de trabalho, etc.

FLC (00:22:55) – Ao contrário, fomos muito vítimas do excesso de mortalidade. Perdemos muitos doentes por causa da corrida, o que nos causou uma profunda irritação, porque na realidade, estávamos, na maior parte dos casos, a tratar de pessoas que, se não fosse a corrida, teriam sobrevivido. E a corrida. De facto, nos doentes oncológicos teve um impacto muito negativo, que depois foi sendo progressivamente mitigado. Repare que estamos a falar de doentes ainda hoje. Isso para nós é um problema muito grande, em particular do tipo de doentes que nós tratamos aqui com doenças cancerosas do sangue. São doentes que não respondem às vacinas, são doentes, têm uma enorme vulnerabilidade a tudo aquilo que tenha que ver com doenças infecciosas. Tiveram mais.

JC (00:23:36) – Tiveram mais medo de vir ao sistema. O sistema também se fechou muito para tratar da certo nós.

FLC (00:23:45) – Apesar de tudo, nós, apesar de tudo, conseguimos manter o que o Instituto de Oncologia a trabalhar e a continuar a receber doentes e não tivemos uma perda significativa da capacidade de atender doentes. Perdemos doentes, como eu disse, porque infelizmente se infectaram e não foi possível salvá los.

FLC (00:24:04) – Houve claramente doentes que não chegaram a nós porque não entraram no sistema, porque não procuraram os médicos, medicina geral e familiar, porque não foram tanto as urgências. E esse atraso teve que ser recuperado a seguir e portanto nós a seguir à pandemia, no ano de 2021 22 em particular, percebemos que estávamos a receber doentes em pior estado, cuja doença tinha evoluído desnecessariamente por não terem tido cuidados. E é um fenómeno que foi sentido em quase todo o mundo diminuição de rastreios, etc. Passada essa fase, enfim, as coisas construíram se, recuperaram se. Mas claramente para responder muito concretamente à pergunta nós passámos a ter muito mais medo do que antes tínhamos das infecções respiratórias de Inverno. Este ano foi um ano particularmente mau, porque associou se os restos da corrida que estão aí e que estão para ficar com ouvido. Não, não desapareceu.

JC (00:24:58) – Há umas gripes aí fortes, pelo menos exactamente.

FLC (00:25:00) – E portanto, aquilo que nós tivemos este ano foi uma associação da Covilhã que sobrou e que está connosco e que hoje em dia já não é pandemia, mas é endémica.

FLC (00:25:10) – Com o surto sazonal habitual da gripe que este ano, mais uma vez, como ciclicamente acontece, foi particularmente violenta. Voltámos a ter vírus de gripe muito agressivos em circulação e portanto foi complicado. E depois, por cima disso, tivemos vírus, enfim, respiratórias essenciais. Enfim, das crianças que passam para os adultos foi um. Foi um inverno complicado este ano difícil.

JC (00:25:33) – A nossa relação com o sistema de saúde é sempre uma relação de necessidade e de expectativa, que é o que é que eu espero do sistema se eu estou doente? Espero que um médico me veja. Não sei bem onde é que vou. Vou aos cuidados primários, vou à urgência hospitalar. O que é que nós precisamos de fazer para, nos próximos anos, reorganizarmos ou repensarmos o sistema de saúde para ele ir progressivamente respondendo àquilo que são as necessidades de hoje em dia, populações mais velhas, com mais doenças, enfim, com um conjunto de coisas. O que é que precisamos de fazer?

FLC (00:26:07) – Eu tenho uma tese que não é original e que obviamente não, não sou a única que partilho dela.

FLC (00:26:16) – Aquilo que no meu ponto de vista, mais falta nos faz e do ponto de vista da lógica do nosso Serviço Nacional de Saúde, passarmos a ter uma abrangência de resposta que não esteja limitada apenas àquilo que o serviço público neste momento pode oferecer. Quem vê de fora dirão Mas isto são as ideias tradicionais da direita. Não tem nada que ver com Direito nem com esquerda. É outra. Outra grande falácia que está construída em torno em torno.

JC (00:26:42) – Disto tem a ver com o acesso, tem a ver com.

FLC (00:26:44) – O processo de procura, tem que ver com a forma de permitir que isso é que é importante. É a forma de permitir que as pessoas possam, pelo custo mais baixo possível, se quiserem, pelo preço mais baixo possível e, idealmente, gratuitamente, aceder a qualquer médico que esteja disponível no sistema, seja ele público, seja ele privado, que é o que acontece noutros países que têm modelos de financiamento mais próximos daquilo que foi idealizado no fim dos anos 70 do século XIX, na Alemanha, que no fundo se prende com a capacidade de, em qualquer momento, quer através do Estado, quer através de um privado, se for caso disso.

FLC (00:27:26) – E isso necessariamente levará a que as pessoas não sejam duplamente taxadas, possam assegurar se que têm sempre alguém que lhes responde.

JC (00:27:37) – Hoje em dia, na realidade, isso acontece de uma forma mais ou menos implícita, que é quem tem a capacidade de ter um seguro privado que as empresas pagam. Tem essa porta também de acesso?

FLC (00:27:48) – Tem, mas é muito injusto, porque aquilo que nós estamos a falar é de um conjunto de pessoas, quer em termos privados, que. Em termos daquilo que passa a ser a sua contratação. Tem um seguro privado supletivo. E depois há um exemplo que já vimos falar a seguir, que é um pouco ao lado, mas que não está a dar a resposta que deveria dar, que é a ADSE. Mas no caso concreto da maioria dos privados, as pessoas têm um seguro que de alguma forma lhes dá a ilusão de lhes garantir alguma resposta até um determinado ponto que pagam e apesar de o pagarem, continuam a pagar as mesmas taxas de IRS e portanto são duplamente taxados no fundo e no fim do dia, muitas vezes acabam por descobrir que aquele seguro que andaram a pagar só tem uma capacidade de resposta até um determinado ponto a um ponto a partir do qual, nomeadamente a área em que eu trabalho, naquilo que têm que ver com o cancro.

JC (00:28:37) – Se esgota.

FLC (00:28:38) – E claramente se esgota, porque nós, hoje em dia o há pouco dizia que nós evoluímos muitíssimo naquilo que são as nossas respostas para o cancro. Mas esse aumento de resposta veio associado a um aumento brutal do custo. O custo do tratamento do cancro hoje em dia, cresceu muito mais do que a sua própria eficiência.

JC (00:28:57) – Portanto, estamos, por um lado, a pagar o preço do sucesso, porque, como é evidente, estamos a tratar melhor as pessoas. As pessoas estão a viver mais anos de vida e logo, obviamente, o investimento é maior. O sistema devia começar sempre. Estou a pensar anualmente, em particular agora, nos picos das doenças infecciosas. As pessoas correm para as urgências e eu fico sempre a pensar se eles correm para as urgências porque não tiveram outra resposta nos cuidados primários. Se é por uma questão de conforto ou comodidade, ou porque acham que ali de facto conseguem um nível de cuidados melhor. Em relação à situação que já estou aqui a retirar as unhas encravadas e as coisas que não contam para isto, ou a burocracia de ir buscar o atestado.

JC (00:29:42) – Que fenómeno tão português é este de adorarmos as urgências.

FLC (00:29:47) – E.

JC (00:29:48) – Discutirmos há 30.

FLC (00:29:48) – Anos isto? Jorge, é curioso essa história, essa afirmação do fenómeno português, porque ele é mesmo um fenómeno português. Inclusivamente é curioso que populações emigram antes portuguesas nos sítios onde são imigrantes, têm o mesmo comportamento, procura serviços de urgência. Está é quase que eu não diria que seja genético, mas é cultural, claramente. E eu penso que aqui há três, três questões que é preciso separar. Se nós pensarmos bem, o número de indivíduos que recolhe, digamos, ou que recorre ao serviço de urgência para recolher um atestado para para tratar o mundo encravado é residual. Não é que resulte. O que está o principal do problema?

JC (00:30:29) – Porque essa ideia da falsa urgência e.

FLC (00:30:32) – Eu não concordo com a designação de falsa urgência, estou sempre a dizê lo, porque, na perspetiva do utilizador.

JC (00:30:37) – Ele precisa mesmo.

FLC (00:30:38) – Ele precisa mesmo. Ele acha que é urgente e não tem. A maior parte das vezes não tem a segurança, o sangue frio, o que você quiser chamar o conhecimento para poder achar que está em condições de esperar 40 e 08h00.

JC (00:30:53) – Portanto, vai correr para o hospital mais próximo para ir para a urgência mais próxima.

FLC (00:30:56) – E depois há outro fenómeno que não e que não é obviamente despiciendo e por isso é que eu disse que temos que ter mecanismos de garantir que o sistema possa responder em tempo útil a essas pessoas. As pessoas sentem que se não forem à urgência e se esperarem as 48 horas, provavelmente poderão não estar melhores. E vão continuar a precisar de um médico e então vão à urgência. Então, sem ir à urgência, vou já, porque as pessoas, a maior parte das vezes, sentem que não têm quem os acompanhe. E desse ponto de vista, é certo que o modelo dos USF foi uma boa ideia, etc. Mas para a grande maioria dos portugueses, aquilo que lhes falta, o médico assistente, que era uma coisa que antigamente existia e que hoje em dia tendeu a desaparecer.

JC (00:31:38) – A quem é que eu ligo? Como é que eu sei que funciona? Quem é que me atende o telefone do outro lado e que me diz está tudo bem, tranquilo, não tem problema nenhum.

JC (00:31:45) – Lembro me sempre dos meus filhos pequenos a oportunidade de ligar ao pediatra e dizer a criança está com febre? Então calma, claro, tomar um analgésico e ficar em casa da atenção atenta a este sinal ou àquele, mas dá uma tranquilidade.

FLC (00:31:57) – Eu próprio, sendo médico e casado com uma médica, quando eu tinha os meus filhos muito pequeninos, sendo certo que a minha mãe, a minha mãe e a minha mulher faziam pressão no sentido de que eu não estava a ser suficientemente capaz. A minha sogra, felizmente um bocadinho mais longe, muitas vezes eu próprio acabava por já não ser capaz de fazer aquela negociação e então liguem ao pediatra e eu próprio me ligava ao pediatra. Desculpe lá telefonaram então, mas sabe a minha mulher e a minha mulher é médica, mas enfim, é de outra área e portanto achava sempre que é a mãe. E as mães têm sempre essa postura diferente.

JC (00:32:32) – Uma mãe médica e uma mãe.

FLC (00:32:34) – Absolutamente deixou de ser médica naquele momento. Não é mais, não é mais, Não é mais médica, é mãe.

FLC (00:32:40) – Eventualmente, se fosse pediatra talvez fosse diferente. Mas onde eu quero chegar é que na realidade o sistema vai ter que ser construído até pelas próprias nossas particularidades culturais. Vamos ter que criar um sistema que aproxime de um modo geral, os cidadãos dos médicos. E neste momento estamos numa fase muito difícil, porque, como é do conhecimento. É público o número de médicos disponíveis e é relativamente escasso para aquilo que são as nossas necessidades.

JC (00:33:05) – Mas o que é que está a acontecer? Se olharmos para os últimos anos, nós temos mais faculdades de medicina, estamos a formar mais médicos. Existem supostamente matematicamente, mais médicos não estão a ficar no sistema público, estão a emigrar ou estão a acontecer. Três coisas não estão.

FLC (00:33:20) – Disponíveis, Estão a acontecer três coisas. Uma delas era previsível, as outras duas nem tanto. Aquela que era previsível e que de facto, nós ainda estamos a pagar o preço de decisões políticas que foram tomadas durante uma série de anos. Enfim, eu diria 20 anos em que o acesso à formação em medicina era muito difícil em Portugal.

FLC (00:33:38) – E isso determinou que quando nós olhamos para a distribuição etária dos médicos, nós temos um grupo de mais velhos em que eu me incluo, e depois um grupo de muito mais novos. E no meio há um deserto.

JC (00:33:49) – Portanto, temos aqui uma bossa do camelo. No fundo, exactamente entre aqueles que estão a pensar na sua reforma e os jovens médicos que estão a chegar agora.

FLC (00:33:56) – Isso deveria ter sido pensado e devia ter sido prevenido, imaginando aquilo que era, que era inevitável e que os médicos da bolsa da frente, digamos, iriam um dia reformar se e, portanto, iríamos ter um sistema em que não há volta da frente. Só há o deserto, o planalto, até à vossa do fim.

JC (00:34:11) – E imagino que isso possa também ter um custo muito relevante na passagem do testemunho. Porque se não há exatamente.

FLC (00:34:20) – Portanto, este fenómeno.

JC (00:34:22) – No fundo.

FLC (00:34:23) – Este é o grande problema que nós temos e que nós não temos um número suficiente de médicos, digamos, mais velhos, mais experientes, para poder, em paridade, ensinar aqueles que estão agora a ser formados.

FLC (00:34:34) – Esse é um problema que era previsível e que deveria ter sido tratado, obviamente, tendo muito mais cautela naquilo que teve que ver com a formação de toda a gente muito preocupada. E aqui os organismos profissionais terão alguma responsabilidade. Não vale a pena escondê lo. Estavam todos muito preocupados com o espectro do desemprego médico. Vivia se muito a ideia de que um dia haveria médicos desempregados, o que é claramente uma falácia. Não há médicos desempregados. Houve noutros países. Nunca houve em Portugal, por circunstâncias várias, mas depois nomeadamente essa que acabamos de citar. Mas depois há outra coisa que as pessoas não acautelarem, que era a adesão ao Espaço económico Europeu, o facto de a.

JC (00:35:12) – Livre circulação e.

FLC (00:35:12) – A livre circulação, que obviamente funciona muito mais a favor dos outros do que a favor de nós por causa da questão linguística.

JC (00:35:18) – Sendo que eles próprios e quer ingleses, quer alemães, quer franceses, tem também um problema próximo do nosso em relação a este confronto entre o aumento de uma população e a necessidade de maiores cuidados de saúde e, portanto, vão ao mercado europeu e vão em busca de médicos.

JC (00:35:35) – E os médicos portugueses estão bem qualificados e, portanto, movem se.

FLC (00:35:40) – E pior ainda, os médicos portugueses, de um modo geral, falam inglês muito francês, falam que têm facilidade em aprender outra língua e, havendo vários incentivos para ir para fora, quer em termos remuneratórios, quer em termos de condições de trabalho. Porque de facto, o Estado português deixou degradar muito as condições físicas estruturais dos hospitais, nomeadamente nos grandes centros, leva a que essas pessoas vão para fora e nós tenhamos uma maior dificuldade em capturar essas pessoas. Portanto, o movimento não é unívoco, é um movimento muito de extravasam de Portugal para outros países do espaço económico Europeu.

JC (00:36:17) – Porque isto de estar a trabalhar num sítio que tem piores condições, onde as cadeiras não são boas de sentar ou a luz não é boa, também conta no fim do dia.

FLC (00:36:25) – Eu estou sempre a dizer que quando nós olhamos para os problemas do Serviço Nacional de Saúde, para lá daquilo que eu falei, que tem que ver com o facto de as pessoas poderem encontrar formas de se financiarem para procurar os cuidados onde eles estão.

FLC (00:36:39) – Depois há um outro problema que tem que ver especificamente com o sistema de saúde, que é o facto de nós, durante tempo demais, andámos demasiado preocupados em adquirir alta tecnologia, esquecemo nos de manter as pequenas coisas. Como foi dito, as pessoas não olharam para o tampo da sanita. Para o estoque que está avariado, para a janela que não funciona, para o autoclismo que se avaria e por aí fora. E tudo isso, a parede que se esboroa, enfim, tudo isso conta. Hoje em dia uma pessoa entra num hospital privado e de um modo geral, as condições da aparência hoteleira são apelativas, quer para quem lá vai, para quem lá trabalha. Não é igual nos hospitais públicos, mesmo que eventualmente nós possamos dizer às pessoas e em muitos casos é verdade. E ainda continua a ser verdade que a tecnologia disponível e o saber das pessoas que estão no público compensa largamente essa pior hotelaria. Só que isso funciona até um determinado ponto e acaba por, de alguma forma, também influenciar as escolhas dos profissionais.

FLC (00:37:44) – Há um par.

JC (00:37:45) – De semanas eu conversei com um politólogo que me dava uma um curioso, um curioso prisma sobre esta questão, que é quando o sistema de saúde, o SNS em particular, começou em Portugal, os profissionais, em particular os médicos, estavam profundamente apaixonados e olharam para isto como uma missão de vida verdadeiramente. Esta nova geração tem também a mesma paixão ou é mais pragmática e tem necessidades diferentes, ou precisa de ser acarinhada.

FLC (00:38:15) – Eu sou obrigado a começar por dizer uma coisa que me choca quando digo eu durante muito tempo estava convencido que não havia generation gap, que não havia gap de gerações. Eu estava convencido, quando tinha 30 anos, que era muito moderno e que havia de chegar aos 60 e muitos ainda continua a ser muito moderno e que a geração que vinha atrás de mim haveria de olhar para mim como uma geração única. E essa ingenuidade já me passou. É evidente que existe generation gap e quando eu me projecto naquilo que eu era aos 30 anos, para aquilo que os meus colegas são aos 30 anos, aquilo que eu percebo hoje é que eles têm uma menor tolerância para a insatisfação e têm uma menor tolerância para as más condições de trabalho e para o processo de trabalho que nós tínhamos.

FLC (00:39:03) – O problema desta geração é eu não, não estou a dizer que eles não tenham razão. Eu vejo isto nos meus filhos. Vejo isso nos médicos com quem lido todos os dias que poderiam ser meus filhos. Eu tenho muito mais dificuldade em dizer lhes como me diziam a mim. Eu achava normal trabalhar três ou quatro serviços de urgência por semana ou eventualmente estar em dias em que eu quase não me cruzava com a minha mulher, porque isto éramos dois médicos e portanto, fazíamos daquilo a nossa vida hoje em dia. E eles porventura têm razão. Eles percebem que isso tem um preço a longo prazo, preço que eu pago, que outros pagam. Felizmente a minha vida correu bem, mas não é por acaso. Se calhar, que as taxas de divórcio em médicos são altíssimas. Não é por acaso que se calhar as taxas de suicídio em médicos são muito elevadas e hoje em dia os preocupam se com isso e preocupam se. Ainda bem que se preocupam.

JC (00:39:53) – Com isso e querem viver a vida e.

FLC (00:39:55) – Querem viver a vida.

FLC (00:39:56) – Ainda bem que querem viver, até porque quem não vive a vida, quem não arranja tempo para viver a vida, nunca poderá ser um bom médico e portanto, na altura, o que é que nós fazíamos nós para conseguir ter as duas coisas? Andávamos literalmente extenuados. E eu não acho que isso tenha que ser necessariamente assim. E, portanto, o sistema hoje em dia tem que se tornar mais user friendly para todos. E reparem, quando eu comecei a trabalhar eu não tinha computador. Se eu disser isto às pessoas, elas riem se. Mas é verdade. Há 40 anos atrás, quando comecei a trabalhar, os registos eram em papel e não havia computadores e ainda me lembro de comprar o meu primeiro PC. Já era mais que médico porque o meu primeiro curriculum vitae para concurso foi escrito numa máquina de escrever e.

JC (00:40:38) – Agora temos os registos. Está tudo no computador, É mais fácil, podemos partilhar informação e benefício.

FLC (00:40:44) – Eles vêem uma sociedade em que tudo é teoricamente mais fácil. Porque é que o raio da vida deles há de ser mais difícil? No fundo, se a sociedade lhes vende a ideia e em muitas coisas é mais fácil, porque é que o dia a dia deles tem que ser mais difícil do que os amigos que têm uma vida mais tranquila com outras profissões que escolheram? Porque é que a medicina há de ser uma tremenda chatice?

JC (00:41:06) – Tenho uma curiosidade o que é que diz aos seus internos para os para os animar, Para os estimular.

FLC (00:41:11) – Acima de tudo? Tenho tido a sorte de encontrar médicos brilhantes e excelentes e que é importante perceber que esta sua atitude não quer dizer que eles sejam piores médicos, bem pelo contrário, estão mais bem.

JC (00:41:22) – Preparados tecnicamente em muitas coisas. Comparação com outras coisas sim.

FLC (00:41:26) – E acima de tudo e acima de tudo, eles têm uma maior vontade de conversar com as pessoas do que nós tínhamos. Talvez hoje, talvez hoje, por causa deles próprios, quererem ter uma vida melhor. E eu vejo isso. Curiosamente, em alguns dos médicos, há algum cinismo que eu já fui adquirindo com o tempo e com a experiência que eles não têm esta idade também. Mas ainda bem que não tenha. Ainda bem que não o têm. Ainda bem que sofrem com as coisas. Ainda bem que estão dispostos a acompanhar melhor os doentes e que por isso precisam de ser apoiados e criados. E por isso é que a minha relação hoje em dia com os com os médicos mais novos, como digo alguns deles, podiam ser meus filhos. É na perspetiva de, por um lado, tentar estimulá los para aquilo que há de melhor e mais interessante naquilo que são as possibilidades técnicas, contando lhes estas histórias.

FLC (00:42:15) – Olha, quando eu comecei este medicamento não tinha sido inventado, sabes? Nós tínhamos que fazer assim e assado e tal. Há um.

JC (00:42:21) – Percurso.

FLC (00:42:22) – Um percurso.

JC (00:42:23) – Há coisas para oferecer e portanto, há aqui uma dinâmica e.

FLC (00:42:26) – Acima de tudo, manter lhes a esperança viva de que necessariamente as coisas tenderão naturalmente a melhorar. Até porque, enfim, é inevitável, como eu disse há pouco, a tal distribuição de duas bossas, a vossa digamos que está mais atrasada. Ela, a bolsa vai crescer e as condições de trabalho melhoram e neste momento a carga de trabalho é brutal, porque aquilo que há para fazer tem de ser distribuído por menos.

JC (00:42:49) – Gente e, portanto, tem que estar à frente. Aplica se só aos médicos ou outros profissionais. Há bocadinho falamos dos psicólogos, falamos dos enfermeiros. Há aqui uma distribuição mais multidisciplinar, do tipo.

FLC (00:42:59) – De mais e uma das coisas que o sistema português vai ter que evoluir. E aqui há claramente um atraso no sistema português, nomeadamente na relação entre médicos e enfermeiros.

FLC (00:43:08) – Nós estamos sempre a falar da falta de médicos, mas em Portugal temos ainda maior falta de enfermeiros da qual ninguém fala. Se nós formos olhar para aquilo que são os relatórios internacionais na proporção médicos e enfermeiros, nós estamos do lado pior da distribuição, ou seja, temos muito mais médicos do que aquilo que devíamos ter para o número de enfermeiros que temos. Ou, se quisermos, ao contrário, temos muito menos enfermeiros do que aqueles que iam ter Para o número de médicos que temos.

JC (00:43:34) – Chegaremos a algum dia em que os cidadãos tenham acesso a lugares de decisão dentro dos organismos de saúde.

FLC (00:43:44) – Essa é uma matéria altamente complexa. Eu acho que hoje os cidadãos têm mais voz do que tinham seguramente há mais anos e já há mecanismos legalmente previstos para terem mais voz. Mas isto leva nos a uma outra discussão que é, do meu ponto de vista, muito mais aliciante e que tem que ver com até que ponto é que os cidadãos devem ter mais voz em tudo aquilo que têm que ver com o sistema político e com as decisões, naquilo que têm que ver com as políticas públicas.

FLC (00:44:15) – E hoje em dia, o nosso sistema, nomeadamente o sistema eleitoral que nós temos, ainda afasta demasiado os cidadãos da decisão sobre as políticas públicas.

JC (00:44:26) – Portanto, precisamos de um trabalho de maior inclusão de da opinião dos cidadãos.

FLC (00:44:31) – Claramente isto, no meu ponto de vista, passaria por nós evoluirmos para um sistema, nomeadamente para a eleição do Parlamento. Enfim, que está está na berra, está na ordem do dia em que o cidadão não seja chamado a votar numa lista de pessoas mais ou menos incógnitas, mas passar a ter a sensação de que elege alguém A.

JC (00:44:52) – Personalização é.

FLC (00:44:53) – Alguém que tem que lhe prestar contas também do trabalho que está a fazer, Porque neste momento a verdade dos factos é que na maior parte dos casos, os eleitos, os nomeados, não sentem a necessidade de prestar pessoalmente contas pelas decisões que tomam, por aquilo que.

JC (00:45:10) – Fazem em relação ao seu eleitorado.

FLC (00:45:13) – Em relação ao cidadão. É por isso que eu acho e é importante. A legislação já prevê, nomeadamente, a inclusão de concelhos ou de pessoas da comunidade, do conselho da Comunidade na gestão dos hospitais.

FLC (00:45:27) – Mas ainda há um passo importante para tornar essa presença como uma presença útil. E ela pode ser muito útil se daí resultar em instrumentos de informação que permitam depois aos decisores públicos tomarem as melhores decisões para responder às necessidades dessas populações.

JC (00:45:43) – Dedicou toda a sua vida à medicina, depois a cargos públicos. Pensar a programas de saúde serviu enquanto secretário de. Depois sobre um período breve enquanto ministro. O que lhe falta fazer?

FLC (00:45:55) – Muita coisa. Há coisas de que eu ainda gostaria de fazer ao nível do serviço público. Mas, acima de tudo, aquilo que hoje em dia me dá mais satisfação é ser médico. E, portanto, quando eu digo que me falta muita coisa, eu quero aproveitar ao máximo os anos que me restam de exercício profissional. Serão entre 2 a 6, não serão muitos para poder ainda, de alguma forma, fazer duas coisas Uma e como, como dizia há pouco, ter tempo para poder fazer uma análise do que fiz pública lá no fundo, fazer uma prestação de contas pública daquilo que foi o meu trabalho enquanto médico e não só.

FLC (00:46:36) – E, por outro lado, também aproveitar este tempo que mês que me espera para ainda poder gozar, enfim, desfrutar de algum avanço tecnológico que está aí. Porque o que mais pena me faz é saber que tudo aquilo que está aí para para vir e que eu imagino que será muito bom, porventura já já não estarei enfim, com a mão na massa para usufruir dela. Mas enfim, os que vêm a seguir com certeza que saberão utilizar da melhor forma essas essas terapêuticas. E eu antevejo um mundo maravilhoso naquilo que tem que ver com a medicina. Muito sinceramente, o.

JC (00:47:09) – Que é um dia bom?

FLC (00:47:11) – Um dia bom é chegar ao fim do dia e ter aquela sensação de que fiz tudo aquilo que eu esperava poder fazer e que acima de tudo, não ficaram muitas coisas por fazer e que essas coisas que não ficaram por fazer não foi por incapacidade de meios para as poder realizar. Se chegar ao fim do dia assim já digo que foi um dia bom. Muito obrigado. Muito obrigado.

A palavra ódio mata? Carlos Alberto Poiares
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Como aprendemos? Paula Marques
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O que perguntar ao médico? António Vaz Carneiro
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Como fotografar o momento certo? João Porfírio
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Estar doente é recordar o nosso estatuto de seres mortais.

A sensação de desamparo, medo, imprevisibilidade e necessidade de ajuda é real e verdadeira.

Quanto mais séria for a condição de saída, mais aguda é essa necessidade.

Necessidade de reparação. Física e psicológica.


TÓPICOS E TEMPOS

Escutar os Doentes (00:03:15) Como escutam os médicos os seus doentes, Fernando Leal da Costa fala sobre a importância da comunicação não verbal.

Linguagem na Comunicação Médica (00:06:34) Fernando Leal da Costa discute a importância de traduzir as informações médicas para uma linguagem compreensível e de separar o que é importante do acessório, nos relatórios médicos.

Impacto da Internet e Inteligência Artificial (00:08:09) A discussão aborda o impacto da ‘internet’ e da inteligência artificial na medicina, salientando a necessidade de orientar os doentes e o potencial tranquilizador ou inquietante destas ferramentas.

Medicina Baseada na Evidência e Inteligência Artificial (00:10:47) A medicina baseada na evidência e o debate sobre a capacidade atual das máquinas em substituir o diagnóstico humano.

Responsabilidade na Era da Inteligência Artificial (00:13:22) A discussão centra-se na responsabilidade e na confiança na era da inteligência artificial, abordando o papel do médico como mediador e a importância da confiança do doente.

Lidar com a Incerteza na Prática Médica (00:16:17) A complexidade de lidar com a incerteza na prática médica, especialmente em situações de tratamento paliativo, e a importância de ser honesto com o doente.

A Importância da Escuta Ativa (00:18:16) O médico discute a importância de mudar a conversa para assegurar que o doente seja ouvido.

Adaptação à Doença (00:19:26) O médico aborda diferentes mecanismos de adaptação dos doentes à doença, incluindo a negação e a procura por informações.

A Relação entre Pensamento Positivo e Prognóstico (00:21:19) É discutida a relação entre o pensamento positivo dos doentes e o prognóstico, especialmente em casos de cancro.

Impacto da Pandemia nos Profissionais de Saúde (00:25:56) O médico fala sobre o impacto da pandemia nos profissionais de saúde, incluindo a perda de doentes e o medo das infeções respiratórias.

Reorganização do Sistema de Saúde (00:29:22) O médico propõe uma reorganização do sistema de saúde para ampliar a resposta e assegurar acesso a qualquer médico disponível, público ou privado.

Custo do Tratamento do Cancro (00:31:53) É abordado o aumento do custo do tratamento do cancro em comparação com a eficácia do tratamento.

O Custo do Sucesso (00:32:12) Discussão sobre o aumento da procura por serviços de saúde, o fenómeno das urgências e a busca por atendimento médico.

Falta de Médicos Experientes (00:36:20) Falta de médicos mais velhos para ensinar a nova geração, consequências das decisões políticas e distribuição etária dos médicos.

Emigração de Médicos (00:38:27) Motivos da emigração de médicos portugueses para outros países da União Europeia e as condições de trabalho.

Desafios da Nova Geração (00:41:30) A menor tolerância da nova geração para más condições de trabalho e a procura por um equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Adaptação às Mudanças (00:43:53) A evolução da medicina com a introdução da tecnologia e a necessidade de tornar o sistema mais amigável para os médicos.

A Importância da Comunicação Médico-Paciente (00:44:41) Discussão sobre a vontade de conversar dos médicos mais novos e a necessidade de apoio e estímulo.

Mudanças no Sistema de Saúde (00:45:38) Reflexão sobre a dinâmica da evolução da medicina e a distribuição desigual de médicos e enfermeiros em Portugal.

Participação dos Cidadãos nas Decisões de Saúde (00:46:59) Debate sobre a voz dos cidadãos na política de saúde e a necessidade de maior inclusão e responsabilidade dos eleitos.

O Futuro da Medicina (00:50:26) Reflexão sobre a satisfação profissional enquanto médico e a expectativa de avanços tecnológicos na medicina.


Nesta edição ouço um médico com quem aprendi muitas coisas. Falei com ele ao longo da vida, e nos seus vários papeis, dezenas de vezes.

Médico, pensador da saúde pública, alto funcionário do SNS e até, secretário de estado e finalmente ministro da saúde.

Falo de Fernando Leal da Costa.

É médico especialista em hematologia e oncologia.

De forma mais direta e muito simplifica da: trata doentes com cancro no sangue.

O que significa ouvir muitos doentes, explicar coisas difíceis, saber que nunca se sabe de tudo a todo o tempo e cultivar uma relação de confiança com outros seres humanos em grande sofrimento.

É sobre esse momento quase sagrado da fala e da escuta que nos debruçamos nesta edição.

O momento da pergunta e das respostas.

Da esperança e dos limites da possibilidade humana de resgatar o outro.

Entre a compaixão e o caminho que ainda falta percorrer.

Com o diálogo necessário, delicado e negociado entre o médico e o doente.

O que quer saber tudo. O que evita saber e delega tudo.

A comunicação não inclui só palavras. Há os gestos e os não ditos.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

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JC (00:00:00) – Viva. Professor Fernando Leal da Costa, médico hematologista e oncologista, tem as duas especialidades. Teve um pé também pela política e al…

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JC (00:00:00) – Viva. Professor Fernando Leal da Costa, médico hematologista e oncologista, tem as duas especialidades. Teve um pé também pela política e alguém que intervém na sociedade a refletir sobre estas coisas de saúde. Interessa muito. Para começar, é sempre uma curiosidade que eu tenho, que é como é que se escutam os doentes.

FLC (00:00:25) – Com muita atenção. Há um conjunto de mensagens que são relativamente directas e que resultam das perguntas que nós, mais ou menos, eu diria consuetudinária mente fazemos. E depois há toda uma comunicação associada, que era a forma como as coisas são ditas, que era aquilo que não é dito, a própria mímica que nos transmite um conjunto de informações muito importantes para conhecermos aquela pessoa e de alguma forma conseguirmos adaptar progressivamente a nossa mensagem a aquilo que são, por um lado, as necessidades e, por outro lado, os desejos de quem nos escuta.

JC (00:01:08) – Isso vê se logo desde o momento em que essa pessoa entra no consultório.

FLC (00:01:13) – Sim, quando já temos algum treino. A forma como a pessoa se aproxima de nós se dirige até à cadeira onde se vai sentar.

FLC (00:01:24) – O tempo que por vezes espera até decidir sentar se ou eventualmente até alguns doentes, enfim, mais tradicionais, esperarem que lhes seja indicado que se devem sentar. Tudo isso são indicações preciosas e depois a própria forma como aqueles metros são percorridos, uma vez que nós infelizmente não temos acesso a ver o doente percorrer o corredor e essa seria uma informação importante. Aqueles pequenos métodos já nos dizem muito sobre, por exemplo, a condição física da pessoa, a condição emocional e já nos prepara de alguma forma para aquilo que nós podemos. Quer em termos daquilo que são as ferramentas terapêuticas, quer em termos daquilo que são as ferramentas comunicacionais. Utilizar quer.

JC (00:02:06) – Dizer que o corpo que o nosso corpo fala.

FLC (00:02:09) – Muitíssimo. Muitíssimo. E essa é uma das partes mais importantes da medicina e sermos capazes de ler. Toda a comunicação que está associada à pessoa e que não depende estritamente da fala. As pessoas literalmente falam com o corpo e o corpo sendo observado. Transmite nos imensa informação de extrema utilidade para as decisões que temos que tomar em proveito dessa própria pessoa.

JC (00:02:36) – Quando, Quando nós estamos numa situação de fragilidade, como é o caso dos doentes e em particular doentes de cancro, onde as notícias não são boas e o início da conversa, digamos, nós, pelo menos aqueles doentes que que mais, que mais cuida? Preocupa se com no fundo com o medico. Ex. Há sempre aquela quando nós abrimos um exame médico não entendemos o que é que lá está. O doente no fundo está fragilizado, está com medo, muitas vezes naturalmente, não sabe o que é, o que lhe está a acontecer, não sabe como é que é o futuro. E depois há ali um médico que que o pode ajudar, seguramente. E então ele é a linguagem.

FLC (00:03:19) – É fundamental descodificar e traduzir para termos que sejam perceptíveis por toda a gente a informação que nós consideramos que é importante para essa pessoa. Normalmente, os relatórios dos exames têm muita informação que eventualmente até pode ser importante para o médico. Pode ser importante até como controlo de qualidade relativamente a quem lê aquilo, mas que não tem nenhum impacto clínico significativo.

FLC (00:03:49) – É um dos trabalhos que nós temos é explicar aos doentes, separar. No fundo, não diria o trigo do joio, mas aquilo que é importante do que não é importante e, ao mesmo tempo, utilizar linguagem que qualquer pessoa seja capaz de entender.

JC (00:04:01) – A ideia de conseguirmos fazer algum dia, de termos relatórios médicos para tótós pode fazer sentido ou é perigoso e perigoso.

FLC (00:04:09) – É preferível utilizar a linguagem convencional na comunicação entre médicos e depois entregar ao profissional o trabalho de descodificar essa linguagem. E é curioso que os médicos, se o fizerem bem feito, ao fim de algum tempo, assistimos aos doentes a discutirem connosco, quase que em pé de igualdade, as análises clínicas e os exames, porque nós ensinamos lhes eles saberem interpretar aquilo. Isto é extremamente importante para que o doente, ele próprio, seja capaz de fazer uma avaliação do seu, do seu estado, da sua resposta, da forma como funciona. E já.

JC (00:04:48) – Agora, tem uma curiosidade que é o Dr. Google ainda ainda vai aparecendo na Ainda vai aparecendo nas consultas.

FLC (00:04:54) – Muito. E também aí é muito importante nós sermos capazes de descodificar a linguagem dos problemas da net. Eu sou um apaixonado do uso da internet. É que se por um lado facilita aquilo que é a tomada de conhecimento por parte dos doentes, por outro lado, neste momento em que estamos e com as ferramentas, a inteligência artificial será progressivamente cada vez mais complicado. A informação disponível é brutal, enfim, é incomensurável e de difícil digestão. E, portanto, eu sou daqueles que acredita que, por mais que nós possamos eventualmente temer entre aspas o efeito enfim, informativo ou informativo daquilo que não interessa, se o médico tiver um papel de mediador e souber orientar o doente para aqueles que são os sítios onde ele deve pesquisar melhor e estiver sempre disponível para contextualizar e traduzir aquela linguagem. Essas ferramentas são também muito úteis, particularmente porque se forem bem utilizadas, podem ser tranquilizadoras. Se forem, se forem mal utilizadas, são profundamente inquietantes. Lá está.

JC (00:06:12) – Porque nós vamos lá à procura de uma determinada condição, uma determinada condição.

JC (00:06:16) – E o raio do Google geralmente escolhe para nos mostrar o pior do pior, aquilo que é o mais dramático, aquilo que nos atrai mais a atenção. E é assim que o algoritmo funciona.

FLC (00:06:26) – É muito mais fácil, do ponto de vista do tratamento da informação computorizada, escolher os extremos, a dificuldade. E é por isso que nós, humanos, temos um papel importante enquanto mediadores. É fazer a conjugação dos extremos, encontrar um meio termo. E a grande verdade é que todas as classificações, todas as qualificações, sendo necessariamente em termos estatísticos muito discretas, é aquilo e não é outra coisa. No fundo, ao abolir as zonas cinzentas, acaba por abolir o. Digamos, a parte mais significativa da humanidade em termos biológicos.

JC (00:07:04) – Portanto, cada um de nós e cada um. Cada caso é um caso. Cada doente é um doente, cada doença, uma doença tem uma expressão própria.

FLC (00:07:09) – Absolutamente. É por isso que o papel mediador do médico, por enquanto, é o de processar um enorme conjunto de informação, nomeadamente aquela de que falávamos há bocadinho, que é capturada quando nós olhamos para o doente e depois conhecer a evidência disponível e adaptá la àquele caso concreto.

FLC (00:07:32) – A medicina baseada na evidência é uma realidade e uma necessidade, mas a própria definição diz nos que é a utilização da melhor evidência disponível para ajudar o médico e o doente a tomarem as melhores decisões relativamente ao seu caso ou a cada caso concreto.

JC (00:07:46) – Notei que usou a expressão o médico por enquanto.

FLC (00:07:51) – Por que eu? Porque eu acredito e já tive muitas discussões sobre esta matéria com colegas e não só. Eu acredito que nós estamos numa fase muito larvar da inteligência artificial e daquilo que é possível fazer hoje em dia do ponto de vista da computação pura. Mas não vejo nenhuma razão teórica para que eventualmente, um dia, aquilo que para já, nós só ouvimos nos filmes de ficção científica não seja possível com a capacidade de nós, humanos, eventualmente criarmos androides ou que lhes quiser chamar, com uma capacidade de raciocínio, inclusivamente utilizando emoções que são parte importante do raciocínio para poderem realizar algumas tarefas que nós humanos realizamos mais depressa e se calhar com uma maior probabilidade de acertarem. Dito de outra forma, com uma menor probabilidade de erro.

JC (00:08:43) – Mas não é consensual entre a classe médica a forma de usar o tempo, o tempo e o modo de usar essas ferramentas de inteligência.

FLC (00:08:52) – As ferramentas, para já, ainda não existem, com o rigor que nós quereríamos para a interacção clínica. Aquelas que existem são muito boas, nomeadamente para a capacidade de fazer diagnósticos, porque já conseguem capturar muita informação e utilizar raciocínios de probabilística que um cérebro humano tem mais dificuldade em fazer, nomeadamente por conjugar multi variáveis no fundo. E desse ponto de vista, os computadores são imbatíveis. Agora, naquilo que se prende com a adaptação do diagnóstico para a escolha de um tratamento adaptado àquela pessoa, o número de variáveis que nós estamos a falar ainda é demasiado grande para que haja, neste momento, computadores, máquinas que nos substituam a esse ponto.

JC (00:09:37) – Eu tenho uma curiosidade a propósito da inteligência artificial, que é como é que nós lidaremos com um futuro em que a máquina consiga não só sistematicamente resolver melhor problemas que os humanos, consiga aprender ela própria e desenvolver técnicas que os humanos não tão rapidamente consigam fazer, mas perdermos depois a capacidade de que tudo se passe dentro de uma caixa negra que nós não sabemos bem como é que funciona.

JC (00:10:07) – E hoje temos o médico. Eu posso perguntar ao médico. Em última instância, ele é o responsável, permite me dizer, É a minha responsabilidade. Eu sei ou não sei e a máquina não dirá nada. Ficámos aqui no limbo, entre a maravilha da máquina que não podemos abandonar e a maravilha da máquina ou o assustador da máquina que não, que não conseguimos responsabilizar o parar.

FLC (00:10:29) – E esse é um dos grandes problemas da inteligência artificial neste momento. Enfim, outro dia o Alan Musk dizia que enfim, porventura qualquer dia nós teremos que encontrar uma forma de imaginar um rendimento universal garantido, porque haverá desemprego de tal forma no sentido em que as máquinas são capazes de substituir os homens Na maior parte das tarefas que hoje em dia a humanidade realiza. Mas é verdade que, sendo certo que isso é assim naquilo que se prende com a responsabilidade e aquilo que está associado aos valores de responsabilidade, provavelmente nós não teremos capacidade para dispensar, porque não fomos programados de outra forma para dispensar o ser humano. Porque nós, enquanto seres humanos, confiamos noutros seres humanos.

FLC (00:11:15) – A nossa capacidade de confiar numa máquina é porventura mais limitada, até porque nós temos, de alguma maneira, uma certa tendência para imputar aos outros humanos, nomeadamente na relação com os médicos, algum grau de infalibilidade, enquanto que, a priori, nós achamos sempre que as máquinas, mais tarde ou mais cedo, podem se avariar.

JC (00:11:34) – Como é que lida com esse fenómeno de de as vezes terem a expectativa, as pessoas de que é quase Deus?

FLC (00:11:43) – É preciso termos a humildade suficiente dentro de nós próprios para temperar essa expectativa.

JC (00:11:48) – Mas a crença é importante para Para o doente.

FLC (00:11:52) – É fundamental na relação médico doente. Porventura, o passo mais importante é o facto de o doente acreditar no médico. A partir do momento em que o doente deixa de acreditar naquela pessoa que o trata, quebrou se a relação, quebra se a relação a vários níveis. Não vai acreditar nos tratamentos, não vai acreditar naquilo que lhe está a ser dito, não vai ter confiança suficiente para seguir um conselho. E é por isso que uma das principais bases da comunicação por parte do médico é não ser mentiroso.

FLC (00:12:23) – Porque um médico que mente é um médico que pode ser apanhado nas suas mentiras e a partir daí o doente deixa de acreditar no médico. E como é que.

JC (00:12:32) – Se resolve a questão do desconhecimento? Porque imagino que haja determinados doentes que lhe aparecem até de uma forma atípica e que que não há soluções fáceis, não são seguramente previsíveis e, eventualmente, exigem um estudo especial. Como é que lida com essa por esta ambiguidade? No fundo, a relação do conhecimento. Esta pessoa procurou me e eu não lhe posso mentir, mas também não posso retirar o crédito e a fé que há nesta relação entre nós os dois.

FLC (00:13:02) – Há dois pontos importantes aí. Um ponto prende se com o facto de nós, em determinados momentos que estão claramente identificados, termos que ter a capacidade de dizer ao doente aquilo que não sabemos, mas que vamos procurar saber. Ou seja, a relação nunca deve ser na base do eu não sei, não quero saber. Não, eu não sei e vou tentar saber. E depois há um outro momento que de facto é complexo, que é quando nós passamos daquilo que são intervenções de caráter eminentemente curativo ou, se quisermos, de paralisação à distância.

FLC (00:13:36) – Enfim, muito pouco Na medicina é verdadeiramente curativo. Mas na realidade, existem circunstâncias em que nós podemos imaginar um contexto em que, de alguma forma, temos qualquer coisa para oferecer aos doentes que vai melhorar muito a sua qualidade de vida e, eventualmente, a duração da sua vida. Mas há momentos em que nós já não podemos garantir um aumento de duração da vida das pessoas, mas podemos sempre, de alguma forma, garantir uma melhoria do conforto. E desse ponto de vista, temos que responder aos doentes muito em função daquilo que ele quer ouvir. Há doentes que claramente nos dão sinais, que há coisas que preferem não saber.

JC (00:14:13) – Não saber toda a verdade em todo o momento, de uma forma crua, já.

FLC (00:14:17) – Disseram, já me disseram taxativamente isso eu não quero saber. E já ou já houve circunstâncias em que eu percebo que há um ponto da realidade que eu não vou ser capaz de explicar.

JC (00:14:30) – Aquela pessoa, portanto, vai, passinho a passinho, experimentando ver até o ponto, muito lentamente. Quando há uma pergunta directa, imagino que que responda.

JC (00:14:40) – Como é que se lida com a expressão se calhar não é feliz, mas eu vou usá la com a surdez do doente quando recebe um doente, um diagnóstico tão dramático como o do cancro e a partir deste momento, no fundo, deixa de ouvir durante um no resto da consulta. Nas próximas consultas.

FLC (00:15:01) – A22 processos diversos um é esse que tem que ver com aquilo que se prende com o choque imediato. E normalmente o que nós fazemos é quando, a partir de um determinado momento, percebemos que já não estamos a ser ouvidos, mudamos de conversa, passamos para outro ponto. Sugerimos à pessoa que ela, eventualmente, se tiver dúvidas, que escreva, para que não se esquecer delas, voltar a perguntar lhes no ponto seguinte. Quando ficamos claramente com a sensação de que houve coisas importantes que ele não percebeu, repetimo las numa noutra, nas consultas seguintes. Às vezes é preferível que os doentes venham acompanhados e se não vieram acompanhados da primeira vez, nós sugerimos ou ele não quer trazer alguém consigo para poder ajudar depois a falarem sobre isto, etc.

FLC (00:15:47) – E, portanto, isso já é uma mediação em que vamos encontrar um terceiro que possa fazer esse papel e também a ponto em que é aquilo que eu me referi anteriormente, a mecanismos que estão razoavelmente bem tipificados de adaptação à doença. E nós temos que perceber qual é o mecanismo que está em causa e a doentes que assumem como estratégia de adaptação a negação pura e simples.

JC (00:16:11) – Eu não quero saber. É e é um direito legítimo, absolutamente legítimo.

FLC (00:16:15) – É um mecanismo de adaptação que está descrito e que faz parte, enfim, das funções fisiológicas cerebrais do ser humano. E desse ponto de vista, nós não temos o direito de ser violentos ao ponto de contrariar esse mecanismo de adaptação, gerando um maior incómodo, maior perturbação para o doente.

JC (00:16:34) – Então, é no outro topo da escala que é aquele doente que quer saber tudo e eventualmente até quer participar nas decisões terapêuticas para para o futuro, mas que está a lidar com uma complexidade, porque tudo hoje é muito complexo e pede ajuda para para tentar perceber. E faz perguntas do género quantos meses de vida é que eu tenho? O que é que eu posso fazer? Eu preciso? Eu preciso de resolver a minha vida.

JC (00:16:59) – Imagino que esta expressão seja dita muitas vezes no consultório em Portugal.

FLC (00:17:04) – Nem tanto, Curiosamente. Mas para clarificar os doentes que têm aquilo que se chama um espírito de luta. Muitas vezes estes doentes estão associados a um espírito de luta, porque há duas maneiras de lidar com a realidade querer sabê la a doentes que ficam particularmente desesperados e, portanto, esses doentes têm de ser ajudados de outra forma. Porque o facto de quererem saber a realidade ajuda os a ficar ainda mais desesperados. E estes momentos têm de ser lidados com de outra maneira e temos profissionais que nos ajudam nesse campo. O tratamento do cancro não é um tratamento unipessoal, é cada vez mais um tratamento multidisciplinar e portanto, falamos muito uns com os outros, nomeadamente com equipas de psicólogos, psiquiatras, etc. Quando percebemos que essa que é a necessidade de intervenção nessa área.

JC (00:17:53) – E é uma resposta mesmo individualizada.

FLC (00:17:55) – A uma resposta individualizada, mas também, como eu estava a dizer, há doentes que querem saber tudo porque isso os predispõe para a luta. Esses doentes, curiosamente em melhor prognóstico.

FLC (00:18:04) – Enfim, se está razoavelmente bem estudado, a sério? Sim, sim, isso está razoavelmente bem estudado. São os doentes que têm uma maior predisposição para lutar contra a doença, nomeadamente um cancro. Tem um prognóstico melhor do que aqueles que se acomodam ou que negam, ou que pura e simplesmente se deixam levar pelo desespero. Ninguém sabe exactamente porque é que isso é assim. Há muita teoria. O mais fácil é dizer que um doente que tem uma grande capacidade de luta tem uma maior aderência ao tratamento. Mas não é só isso. Nós sabemos que os doentes que têm um fighting spirit, enfim, o termo técnico em inglês mais desenvolvido tem até uma probabilidade menor de recair da sua doença, o que é extremamente curiosa a relação entre o pensamento positivo que ele existe neste caso, e a sobrevivência uma doença como um cancro. E isto não é. Não é uma impressão. Isso está muitíssimo bem estudado, como também sabemos que há circunstâncias em que determinados eventos adversos na vida de uma pessoa, nomeadamente coisas tão complexas ou tão, tão tão simples como um divórcio no curso da sua, da sua doença cancerosa, aumenta a probabilidade de a doença da doença voltar e.

JC (00:19:17) – Provavelmente baixa o nosso sistema.

FLC (00:19:18) – Imunitário a uma. Era isso que eu ia dizer. Há uma relação muito clara entre o estado afectivo e o estado imunitário. Hoje em dia até conhecemos os neurotransmissores. Estão envolvidos nessa matéria. Não é por acaso que, por exemplo, algumas substâncias que são usadas para tratar, enfim, doenças psiquiátricas. Olha, um medicamento muito antigo, o lítio, que é utilizado como estabilizador do humor, tem impacto muito significativo na imunidade a vários níveis, estimulam um conjunto de células importantes, etc. E, portanto, nós somos de facto uma máquina muito complexa, mas muito unitária. É muito, muito errada a ideia de que uma coisa é a nossa vida espiritual ou afectiva, outra coisa é a nossa vida somática. Elas estão completamente interligadas e uma pode ajudar a outra. É uma relação biunívoca. É muito importante.

JC (00:20:06) – Como é que um médico, ao fim de tantos anos a cuidar de doentes, com muitos deles com prognóstico reservados, muitos que que acabam por morrer? Como é que se programa? Como é que resiste? Como é que consegue misturar a dose certa entre humanidade, pragmatismo e defender se mentalmente?

FLC (00:20:27) – Às vezes também nos deprimimos.

FLC (00:20:30) – Eu próprio tenho os meus dias de maior depressão. Tenho os meus dias em que é mais complicado sair da cama para vir trabalhar. Também me canso. Também tenho minhas horas de esgotamento. Mas também, verdade seja dita, tenho tido muitas alegrias ao longo da minha vida enquanto profissional de saúde e portanto, penso sempre e tento agarrar me sempre àqueles que são os aspetos mais positivos que me levam a querer continuadamente, a lutar por saber que ajudei alguém há muitos anos. Eu nem vou dizer aqui antes, porque enfim, seria quase traumático. Mas enfim, posso dizer a quase 40 anos já eu era médico. Estava a discutir exactamente se deveria não ouvir para a especialidade que tenho de hematologia Clínica e essencialmente trato de doentes com cancro do sangue e na altura um médico por quem tenho uma grande consideração. Estava eu a queixar Epá, mas isto há 40 anos atrás, aquelas doenças, enfim, os doentes depois morrem, aquilo muitas vezes não são curáveis. Eu disse ouve lá, mas na verdade. Quantos doentes com esta ou aquela patologia é que tu considera que curaste? E eu pus me a pensar.

FLC (00:21:33) – Na verdade, o essencial da medicina não está na cura, está na capacidade que nós temos de melhorar ao longo da vida a qualidade de vida dessas pessoas e, se possível, prolongar lhes a vida. E desse ponto de vista. Acho que fiz a escolha certa, até porque hoje em dia, claramente. Enfim, depois seria tema de outra conversa. As ferramentas de que dispomos do ponto de vista terapêutico não têm nada a ver com aquilo que fazíamos há 40 anos atrás e, portanto, eu imagino que quem vier a seguir daqui a 40 anos pensem aqueles bárbaros que em 2002 1024 faziam isto e aquilo e não evoluímos. Nem imaginas em 2024 que eles faziam. Mas isso é natural e a evolução? Ainda bem que é assim.

JC (00:22:15) – Há uma coisa que nós acabamos de sair da pandemia de Calvi 19. Tenho a sensação empírica. Não tenho nenhuma estatística sobre isso, de que, enquanto sociedade, estamos todos francamente mais cansados. Até se calhar irritáveis. É, mas a factura principal foi foi nos profissionais de saúde que tiveram que tiveram isso de que conversam, os de que conversa com outros seus colegas médicos que não estão nós aqui?

FLC (00:22:41) – Especificamente no sítio onde trabalho e com a proximidade que tenho, fomos relativamente poupados a uma das partes importantes da corrida, ou seja, fomos poupados as horas excessivas de trabalho, etc.

FLC (00:22:55) – Ao contrário, fomos muito vítimas do excesso de mortalidade. Perdemos muitos doentes por causa da corrida, o que nos causou uma profunda irritação, porque na realidade, estávamos, na maior parte dos casos, a tratar de pessoas que, se não fosse a corrida, teriam sobrevivido. E a corrida. De facto, nos doentes oncológicos teve um impacto muito negativo, que depois foi sendo progressivamente mitigado. Repare que estamos a falar de doentes ainda hoje. Isso para nós é um problema muito grande, em particular do tipo de doentes que nós tratamos aqui com doenças cancerosas do sangue. São doentes que não respondem às vacinas, são doentes, têm uma enorme vulnerabilidade a tudo aquilo que tenha que ver com doenças infecciosas. Tiveram mais.

JC (00:23:36) – Tiveram mais medo de vir ao sistema. O sistema também se fechou muito para tratar da certo nós.

FLC (00:23:45) – Apesar de tudo, nós, apesar de tudo, conseguimos manter o que o Instituto de Oncologia a trabalhar e a continuar a receber doentes e não tivemos uma perda significativa da capacidade de atender doentes. Perdemos doentes, como eu disse, porque infelizmente se infectaram e não foi possível salvá los.

FLC (00:24:04) – Houve claramente doentes que não chegaram a nós porque não entraram no sistema, porque não procuraram os médicos, medicina geral e familiar, porque não foram tanto as urgências. E esse atraso teve que ser recuperado a seguir e portanto nós a seguir à pandemia, no ano de 2021 22 em particular, percebemos que estávamos a receber doentes em pior estado, cuja doença tinha evoluído desnecessariamente por não terem tido cuidados. E é um fenómeno que foi sentido em quase todo o mundo diminuição de rastreios, etc. Passada essa fase, enfim, as coisas construíram se, recuperaram se. Mas claramente para responder muito concretamente à pergunta nós passámos a ter muito mais medo do que antes tínhamos das infecções respiratórias de Inverno. Este ano foi um ano particularmente mau, porque associou se os restos da corrida que estão aí e que estão para ficar com ouvido. Não, não desapareceu.

JC (00:24:58) – Há umas gripes aí fortes, pelo menos exactamente.

FLC (00:25:00) – E portanto, aquilo que nós tivemos este ano foi uma associação da Covilhã que sobrou e que está connosco e que hoje em dia já não é pandemia, mas é endémica.

FLC (00:25:10) – Com o surto sazonal habitual da gripe que este ano, mais uma vez, como ciclicamente acontece, foi particularmente violenta. Voltámos a ter vírus de gripe muito agressivos em circulação e portanto foi complicado. E depois, por cima disso, tivemos vírus, enfim, respiratórias essenciais. Enfim, das crianças que passam para os adultos foi um. Foi um inverno complicado este ano difícil.

JC (00:25:33) – A nossa relação com o sistema de saúde é sempre uma relação de necessidade e de expectativa, que é o que é que eu espero do sistema se eu estou doente? Espero que um médico me veja. Não sei bem onde é que vou. Vou aos cuidados primários, vou à urgência hospitalar. O que é que nós precisamos de fazer para, nos próximos anos, reorganizarmos ou repensarmos o sistema de saúde para ele ir progressivamente respondendo àquilo que são as necessidades de hoje em dia, populações mais velhas, com mais doenças, enfim, com um conjunto de coisas. O que é que precisamos de fazer?

FLC (00:26:07) – Eu tenho uma tese que não é original e que obviamente não, não sou a única que partilho dela.

FLC (00:26:16) – Aquilo que no meu ponto de vista, mais falta nos faz e do ponto de vista da lógica do nosso Serviço Nacional de Saúde, passarmos a ter uma abrangência de resposta que não esteja limitada apenas àquilo que o serviço público neste momento pode oferecer. Quem vê de fora dirão Mas isto são as ideias tradicionais da direita. Não tem nada que ver com Direito nem com esquerda. É outra. Outra grande falácia que está construída em torno em torno.

JC (00:26:42) – Disto tem a ver com o acesso, tem a ver com.

FLC (00:26:44) – O processo de procura, tem que ver com a forma de permitir que isso é que é importante. É a forma de permitir que as pessoas possam, pelo custo mais baixo possível, se quiserem, pelo preço mais baixo possível e, idealmente, gratuitamente, aceder a qualquer médico que esteja disponível no sistema, seja ele público, seja ele privado, que é o que acontece noutros países que têm modelos de financiamento mais próximos daquilo que foi idealizado no fim dos anos 70 do século XIX, na Alemanha, que no fundo se prende com a capacidade de, em qualquer momento, quer através do Estado, quer através de um privado, se for caso disso.

FLC (00:27:26) – E isso necessariamente levará a que as pessoas não sejam duplamente taxadas, possam assegurar se que têm sempre alguém que lhes responde.

JC (00:27:37) – Hoje em dia, na realidade, isso acontece de uma forma mais ou menos implícita, que é quem tem a capacidade de ter um seguro privado que as empresas pagam. Tem essa porta também de acesso?

FLC (00:27:48) – Tem, mas é muito injusto, porque aquilo que nós estamos a falar é de um conjunto de pessoas, quer em termos privados, que. Em termos daquilo que passa a ser a sua contratação. Tem um seguro privado supletivo. E depois há um exemplo que já vimos falar a seguir, que é um pouco ao lado, mas que não está a dar a resposta que deveria dar, que é a ADSE. Mas no caso concreto da maioria dos privados, as pessoas têm um seguro que de alguma forma lhes dá a ilusão de lhes garantir alguma resposta até um determinado ponto que pagam e apesar de o pagarem, continuam a pagar as mesmas taxas de IRS e portanto são duplamente taxados no fundo e no fim do dia, muitas vezes acabam por descobrir que aquele seguro que andaram a pagar só tem uma capacidade de resposta até um determinado ponto a um ponto a partir do qual, nomeadamente a área em que eu trabalho, naquilo que têm que ver com o cancro.

JC (00:28:37) – Se esgota.

FLC (00:28:38) – E claramente se esgota, porque nós, hoje em dia o há pouco dizia que nós evoluímos muitíssimo naquilo que são as nossas respostas para o cancro. Mas esse aumento de resposta veio associado a um aumento brutal do custo. O custo do tratamento do cancro hoje em dia, cresceu muito mais do que a sua própria eficiência.

JC (00:28:57) – Portanto, estamos, por um lado, a pagar o preço do sucesso, porque, como é evidente, estamos a tratar melhor as pessoas. As pessoas estão a viver mais anos de vida e logo, obviamente, o investimento é maior. O sistema devia começar sempre. Estou a pensar anualmente, em particular agora, nos picos das doenças infecciosas. As pessoas correm para as urgências e eu fico sempre a pensar se eles correm para as urgências porque não tiveram outra resposta nos cuidados primários. Se é por uma questão de conforto ou comodidade, ou porque acham que ali de facto conseguem um nível de cuidados melhor. Em relação à situação que já estou aqui a retirar as unhas encravadas e as coisas que não contam para isto, ou a burocracia de ir buscar o atestado.

JC (00:29:42) – Que fenómeno tão português é este de adorarmos as urgências.

FLC (00:29:47) – E.

JC (00:29:48) – Discutirmos há 30.

FLC (00:29:48) – Anos isto? Jorge, é curioso essa história, essa afirmação do fenómeno português, porque ele é mesmo um fenómeno português. Inclusivamente é curioso que populações emigram antes portuguesas nos sítios onde são imigrantes, têm o mesmo comportamento, procura serviços de urgência. Está é quase que eu não diria que seja genético, mas é cultural, claramente. E eu penso que aqui há três, três questões que é preciso separar. Se nós pensarmos bem, o número de indivíduos que recolhe, digamos, ou que recorre ao serviço de urgência para recolher um atestado para para tratar o mundo encravado é residual. Não é que resulte. O que está o principal do problema?

JC (00:30:29) – Porque essa ideia da falsa urgência e.

FLC (00:30:32) – Eu não concordo com a designação de falsa urgência, estou sempre a dizê lo, porque, na perspetiva do utilizador.

JC (00:30:37) – Ele precisa mesmo.

FLC (00:30:38) – Ele precisa mesmo. Ele acha que é urgente e não tem. A maior parte das vezes não tem a segurança, o sangue frio, o que você quiser chamar o conhecimento para poder achar que está em condições de esperar 40 e 08h00.

JC (00:30:53) – Portanto, vai correr para o hospital mais próximo para ir para a urgência mais próxima.

FLC (00:30:56) – E depois há outro fenómeno que não e que não é obviamente despiciendo e por isso é que eu disse que temos que ter mecanismos de garantir que o sistema possa responder em tempo útil a essas pessoas. As pessoas sentem que se não forem à urgência e se esperarem as 48 horas, provavelmente poderão não estar melhores. E vão continuar a precisar de um médico e então vão à urgência. Então, sem ir à urgência, vou já, porque as pessoas, a maior parte das vezes, sentem que não têm quem os acompanhe. E desse ponto de vista, é certo que o modelo dos USF foi uma boa ideia, etc. Mas para a grande maioria dos portugueses, aquilo que lhes falta, o médico assistente, que era uma coisa que antigamente existia e que hoje em dia tendeu a desaparecer.

JC (00:31:38) – A quem é que eu ligo? Como é que eu sei que funciona? Quem é que me atende o telefone do outro lado e que me diz está tudo bem, tranquilo, não tem problema nenhum.

JC (00:31:45) – Lembro me sempre dos meus filhos pequenos a oportunidade de ligar ao pediatra e dizer a criança está com febre? Então calma, claro, tomar um analgésico e ficar em casa da atenção atenta a este sinal ou àquele, mas dá uma tranquilidade.

FLC (00:31:57) – Eu próprio, sendo médico e casado com uma médica, quando eu tinha os meus filhos muito pequeninos, sendo certo que a minha mãe, a minha mãe e a minha mulher faziam pressão no sentido de que eu não estava a ser suficientemente capaz. A minha sogra, felizmente um bocadinho mais longe, muitas vezes eu próprio acabava por já não ser capaz de fazer aquela negociação e então liguem ao pediatra e eu próprio me ligava ao pediatra. Desculpe lá telefonaram então, mas sabe a minha mulher e a minha mulher é médica, mas enfim, é de outra área e portanto achava sempre que é a mãe. E as mães têm sempre essa postura diferente.

JC (00:32:32) – Uma mãe médica e uma mãe.

FLC (00:32:34) – Absolutamente deixou de ser médica naquele momento. Não é mais, não é mais, Não é mais médica, é mãe.

FLC (00:32:40) – Eventualmente, se fosse pediatra talvez fosse diferente. Mas onde eu quero chegar é que na realidade o sistema vai ter que ser construído até pelas próprias nossas particularidades culturais. Vamos ter que criar um sistema que aproxime de um modo geral, os cidadãos dos médicos. E neste momento estamos numa fase muito difícil, porque, como é do conhecimento. É público o número de médicos disponíveis e é relativamente escasso para aquilo que são as nossas necessidades.

JC (00:33:05) – Mas o que é que está a acontecer? Se olharmos para os últimos anos, nós temos mais faculdades de medicina, estamos a formar mais médicos. Existem supostamente matematicamente, mais médicos não estão a ficar no sistema público, estão a emigrar ou estão a acontecer. Três coisas não estão.

FLC (00:33:20) – Disponíveis, Estão a acontecer três coisas. Uma delas era previsível, as outras duas nem tanto. Aquela que era previsível e que de facto, nós ainda estamos a pagar o preço de decisões políticas que foram tomadas durante uma série de anos. Enfim, eu diria 20 anos em que o acesso à formação em medicina era muito difícil em Portugal.

FLC (00:33:38) – E isso determinou que quando nós olhamos para a distribuição etária dos médicos, nós temos um grupo de mais velhos em que eu me incluo, e depois um grupo de muito mais novos. E no meio há um deserto.

JC (00:33:49) – Portanto, temos aqui uma bossa do camelo. No fundo, exactamente entre aqueles que estão a pensar na sua reforma e os jovens médicos que estão a chegar agora.

FLC (00:33:56) – Isso deveria ter sido pensado e devia ter sido prevenido, imaginando aquilo que era, que era inevitável e que os médicos da bolsa da frente, digamos, iriam um dia reformar se e, portanto, iríamos ter um sistema em que não há volta da frente. Só há o deserto, o planalto, até à vossa do fim.

JC (00:34:11) – E imagino que isso possa também ter um custo muito relevante na passagem do testemunho. Porque se não há exatamente.

FLC (00:34:20) – Portanto, este fenómeno.

JC (00:34:22) – No fundo.

FLC (00:34:23) – Este é o grande problema que nós temos e que nós não temos um número suficiente de médicos, digamos, mais velhos, mais experientes, para poder, em paridade, ensinar aqueles que estão agora a ser formados.

FLC (00:34:34) – Esse é um problema que era previsível e que deveria ter sido tratado, obviamente, tendo muito mais cautela naquilo que teve que ver com a formação de toda a gente muito preocupada. E aqui os organismos profissionais terão alguma responsabilidade. Não vale a pena escondê lo. Estavam todos muito preocupados com o espectro do desemprego médico. Vivia se muito a ideia de que um dia haveria médicos desempregados, o que é claramente uma falácia. Não há médicos desempregados. Houve noutros países. Nunca houve em Portugal, por circunstâncias várias, mas depois nomeadamente essa que acabamos de citar. Mas depois há outra coisa que as pessoas não acautelarem, que era a adesão ao Espaço económico Europeu, o facto de a.

JC (00:35:12) – Livre circulação e.

FLC (00:35:12) – A livre circulação, que obviamente funciona muito mais a favor dos outros do que a favor de nós por causa da questão linguística.

JC (00:35:18) – Sendo que eles próprios e quer ingleses, quer alemães, quer franceses, tem também um problema próximo do nosso em relação a este confronto entre o aumento de uma população e a necessidade de maiores cuidados de saúde e, portanto, vão ao mercado europeu e vão em busca de médicos.

JC (00:35:35) – E os médicos portugueses estão bem qualificados e, portanto, movem se.

FLC (00:35:40) – E pior ainda, os médicos portugueses, de um modo geral, falam inglês muito francês, falam que têm facilidade em aprender outra língua e, havendo vários incentivos para ir para fora, quer em termos remuneratórios, quer em termos de condições de trabalho. Porque de facto, o Estado português deixou degradar muito as condições físicas estruturais dos hospitais, nomeadamente nos grandes centros, leva a que essas pessoas vão para fora e nós tenhamos uma maior dificuldade em capturar essas pessoas. Portanto, o movimento não é unívoco, é um movimento muito de extravasam de Portugal para outros países do espaço económico Europeu.

JC (00:36:17) – Porque isto de estar a trabalhar num sítio que tem piores condições, onde as cadeiras não são boas de sentar ou a luz não é boa, também conta no fim do dia.

FLC (00:36:25) – Eu estou sempre a dizer que quando nós olhamos para os problemas do Serviço Nacional de Saúde, para lá daquilo que eu falei, que tem que ver com o facto de as pessoas poderem encontrar formas de se financiarem para procurar os cuidados onde eles estão.

FLC (00:36:39) – Depois há um outro problema que tem que ver especificamente com o sistema de saúde, que é o facto de nós, durante tempo demais, andámos demasiado preocupados em adquirir alta tecnologia, esquecemo nos de manter as pequenas coisas. Como foi dito, as pessoas não olharam para o tampo da sanita. Para o estoque que está avariado, para a janela que não funciona, para o autoclismo que se avaria e por aí fora. E tudo isso, a parede que se esboroa, enfim, tudo isso conta. Hoje em dia uma pessoa entra num hospital privado e de um modo geral, as condições da aparência hoteleira são apelativas, quer para quem lá vai, para quem lá trabalha. Não é igual nos hospitais públicos, mesmo que eventualmente nós possamos dizer às pessoas e em muitos casos é verdade. E ainda continua a ser verdade que a tecnologia disponível e o saber das pessoas que estão no público compensa largamente essa pior hotelaria. Só que isso funciona até um determinado ponto e acaba por, de alguma forma, também influenciar as escolhas dos profissionais.

FLC (00:37:44) – Há um par.

JC (00:37:45) – De semanas eu conversei com um politólogo que me dava uma um curioso, um curioso prisma sobre esta questão, que é quando o sistema de saúde, o SNS em particular, começou em Portugal, os profissionais, em particular os médicos, estavam profundamente apaixonados e olharam para isto como uma missão de vida verdadeiramente. Esta nova geração tem também a mesma paixão ou é mais pragmática e tem necessidades diferentes, ou precisa de ser acarinhada.

FLC (00:38:15) – Eu sou obrigado a começar por dizer uma coisa que me choca quando digo eu durante muito tempo estava convencido que não havia generation gap, que não havia gap de gerações. Eu estava convencido, quando tinha 30 anos, que era muito moderno e que havia de chegar aos 60 e muitos ainda continua a ser muito moderno e que a geração que vinha atrás de mim haveria de olhar para mim como uma geração única. E essa ingenuidade já me passou. É evidente que existe generation gap e quando eu me projecto naquilo que eu era aos 30 anos, para aquilo que os meus colegas são aos 30 anos, aquilo que eu percebo hoje é que eles têm uma menor tolerância para a insatisfação e têm uma menor tolerância para as más condições de trabalho e para o processo de trabalho que nós tínhamos.

FLC (00:39:03) – O problema desta geração é eu não, não estou a dizer que eles não tenham razão. Eu vejo isto nos meus filhos. Vejo isso nos médicos com quem lido todos os dias que poderiam ser meus filhos. Eu tenho muito mais dificuldade em dizer lhes como me diziam a mim. Eu achava normal trabalhar três ou quatro serviços de urgência por semana ou eventualmente estar em dias em que eu quase não me cruzava com a minha mulher, porque isto éramos dois médicos e portanto, fazíamos daquilo a nossa vida hoje em dia. E eles porventura têm razão. Eles percebem que isso tem um preço a longo prazo, preço que eu pago, que outros pagam. Felizmente a minha vida correu bem, mas não é por acaso. Se calhar, que as taxas de divórcio em médicos são altíssimas. Não é por acaso que se calhar as taxas de suicídio em médicos são muito elevadas e hoje em dia os preocupam se com isso e preocupam se. Ainda bem que se preocupam.

JC (00:39:53) – Com isso e querem viver a vida e.

FLC (00:39:55) – Querem viver a vida.

FLC (00:39:56) – Ainda bem que querem viver, até porque quem não vive a vida, quem não arranja tempo para viver a vida, nunca poderá ser um bom médico e portanto, na altura, o que é que nós fazíamos nós para conseguir ter as duas coisas? Andávamos literalmente extenuados. E eu não acho que isso tenha que ser necessariamente assim. E, portanto, o sistema hoje em dia tem que se tornar mais user friendly para todos. E reparem, quando eu comecei a trabalhar eu não tinha computador. Se eu disser isto às pessoas, elas riem se. Mas é verdade. Há 40 anos atrás, quando comecei a trabalhar, os registos eram em papel e não havia computadores e ainda me lembro de comprar o meu primeiro PC. Já era mais que médico porque o meu primeiro curriculum vitae para concurso foi escrito numa máquina de escrever e.

JC (00:40:38) – Agora temos os registos. Está tudo no computador, É mais fácil, podemos partilhar informação e benefício.

FLC (00:40:44) – Eles vêem uma sociedade em que tudo é teoricamente mais fácil. Porque é que o raio da vida deles há de ser mais difícil? No fundo, se a sociedade lhes vende a ideia e em muitas coisas é mais fácil, porque é que o dia a dia deles tem que ser mais difícil do que os amigos que têm uma vida mais tranquila com outras profissões que escolheram? Porque é que a medicina há de ser uma tremenda chatice?

JC (00:41:06) – Tenho uma curiosidade o que é que diz aos seus internos para os para os animar, Para os estimular.

FLC (00:41:11) – Acima de tudo? Tenho tido a sorte de encontrar médicos brilhantes e excelentes e que é importante perceber que esta sua atitude não quer dizer que eles sejam piores médicos, bem pelo contrário, estão mais bem.

JC (00:41:22) – Preparados tecnicamente em muitas coisas. Comparação com outras coisas sim.

FLC (00:41:26) – E acima de tudo e acima de tudo, eles têm uma maior vontade de conversar com as pessoas do que nós tínhamos. Talvez hoje, talvez hoje, por causa deles próprios, quererem ter uma vida melhor. E eu vejo isso. Curiosamente, em alguns dos médicos, há algum cinismo que eu já fui adquirindo com o tempo e com a experiência que eles não têm esta idade também. Mas ainda bem que não tenha. Ainda bem que não o têm. Ainda bem que sofrem com as coisas. Ainda bem que estão dispostos a acompanhar melhor os doentes e que por isso precisam de ser apoiados e criados. E por isso é que a minha relação hoje em dia com os com os médicos mais novos, como digo alguns deles, podiam ser meus filhos. É na perspetiva de, por um lado, tentar estimulá los para aquilo que há de melhor e mais interessante naquilo que são as possibilidades técnicas, contando lhes estas histórias.

FLC (00:42:15) – Olha, quando eu comecei este medicamento não tinha sido inventado, sabes? Nós tínhamos que fazer assim e assado e tal. Há um.

JC (00:42:21) – Percurso.

FLC (00:42:22) – Um percurso.

JC (00:42:23) – Há coisas para oferecer e portanto, há aqui uma dinâmica e.

FLC (00:42:26) – Acima de tudo, manter lhes a esperança viva de que necessariamente as coisas tenderão naturalmente a melhorar. Até porque, enfim, é inevitável, como eu disse há pouco, a tal distribuição de duas bossas, a vossa digamos que está mais atrasada. Ela, a bolsa vai crescer e as condições de trabalho melhoram e neste momento a carga de trabalho é brutal, porque aquilo que há para fazer tem de ser distribuído por menos.

JC (00:42:49) – Gente e, portanto, tem que estar à frente. Aplica se só aos médicos ou outros profissionais. Há bocadinho falamos dos psicólogos, falamos dos enfermeiros. Há aqui uma distribuição mais multidisciplinar, do tipo.

FLC (00:42:59) – De mais e uma das coisas que o sistema português vai ter que evoluir. E aqui há claramente um atraso no sistema português, nomeadamente na relação entre médicos e enfermeiros.

FLC (00:43:08) – Nós estamos sempre a falar da falta de médicos, mas em Portugal temos ainda maior falta de enfermeiros da qual ninguém fala. Se nós formos olhar para aquilo que são os relatórios internacionais na proporção médicos e enfermeiros, nós estamos do lado pior da distribuição, ou seja, temos muito mais médicos do que aquilo que devíamos ter para o número de enfermeiros que temos. Ou, se quisermos, ao contrário, temos muito menos enfermeiros do que aqueles que iam ter Para o número de médicos que temos.

JC (00:43:34) – Chegaremos a algum dia em que os cidadãos tenham acesso a lugares de decisão dentro dos organismos de saúde.

FLC (00:43:44) – Essa é uma matéria altamente complexa. Eu acho que hoje os cidadãos têm mais voz do que tinham seguramente há mais anos e já há mecanismos legalmente previstos para terem mais voz. Mas isto leva nos a uma outra discussão que é, do meu ponto de vista, muito mais aliciante e que tem que ver com até que ponto é que os cidadãos devem ter mais voz em tudo aquilo que têm que ver com o sistema político e com as decisões, naquilo que têm que ver com as políticas públicas.

FLC (00:44:15) – E hoje em dia, o nosso sistema, nomeadamente o sistema eleitoral que nós temos, ainda afasta demasiado os cidadãos da decisão sobre as políticas públicas.

JC (00:44:26) – Portanto, precisamos de um trabalho de maior inclusão de da opinião dos cidadãos.

FLC (00:44:31) – Claramente isto, no meu ponto de vista, passaria por nós evoluirmos para um sistema, nomeadamente para a eleição do Parlamento. Enfim, que está está na berra, está na ordem do dia em que o cidadão não seja chamado a votar numa lista de pessoas mais ou menos incógnitas, mas passar a ter a sensação de que elege alguém A.

JC (00:44:52) – Personalização é.

FLC (00:44:53) – Alguém que tem que lhe prestar contas também do trabalho que está a fazer, Porque neste momento a verdade dos factos é que na maior parte dos casos, os eleitos, os nomeados, não sentem a necessidade de prestar pessoalmente contas pelas decisões que tomam, por aquilo que.

JC (00:45:10) – Fazem em relação ao seu eleitorado.

FLC (00:45:13) – Em relação ao cidadão. É por isso que eu acho e é importante. A legislação já prevê, nomeadamente, a inclusão de concelhos ou de pessoas da comunidade, do conselho da Comunidade na gestão dos hospitais.

FLC (00:45:27) – Mas ainda há um passo importante para tornar essa presença como uma presença útil. E ela pode ser muito útil se daí resultar em instrumentos de informação que permitam depois aos decisores públicos tomarem as melhores decisões para responder às necessidades dessas populações.

JC (00:45:43) – Dedicou toda a sua vida à medicina, depois a cargos públicos. Pensar a programas de saúde serviu enquanto secretário de. Depois sobre um período breve enquanto ministro. O que lhe falta fazer?

FLC (00:45:55) – Muita coisa. Há coisas de que eu ainda gostaria de fazer ao nível do serviço público. Mas, acima de tudo, aquilo que hoje em dia me dá mais satisfação é ser médico. E, portanto, quando eu digo que me falta muita coisa, eu quero aproveitar ao máximo os anos que me restam de exercício profissional. Serão entre 2 a 6, não serão muitos para poder ainda, de alguma forma, fazer duas coisas Uma e como, como dizia há pouco, ter tempo para poder fazer uma análise do que fiz pública lá no fundo, fazer uma prestação de contas pública daquilo que foi o meu trabalho enquanto médico e não só.

FLC (00:46:36) – E, por outro lado, também aproveitar este tempo que mês que me espera para ainda poder gozar, enfim, desfrutar de algum avanço tecnológico que está aí. Porque o que mais pena me faz é saber que tudo aquilo que está aí para para vir e que eu imagino que será muito bom, porventura já já não estarei enfim, com a mão na massa para usufruir dela. Mas enfim, os que vêm a seguir com certeza que saberão utilizar da melhor forma essas essas terapêuticas. E eu antevejo um mundo maravilhoso naquilo que tem que ver com a medicina. Muito sinceramente, o.

JC (00:47:09) – Que é um dia bom?

FLC (00:47:11) – Um dia bom é chegar ao fim do dia e ter aquela sensação de que fiz tudo aquilo que eu esperava poder fazer e que acima de tudo, não ficaram muitas coisas por fazer e que essas coisas que não ficaram por fazer não foi por incapacidade de meios para as poder realizar. Se chegar ao fim do dia assim já digo que foi um dia bom. Muito obrigado. Muito obrigado.

A palavra ódio mata? Carlos Alberto Poiares
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